23 fevereiro 2006

Zeca Afonso

À memória de Zeca Afonso, que morreu há 19 anos.

Chamaram-me um dia
Cigano e maltês
Menino, não és boa rês
Abri uma cova
Na terra mais funda
Fiz dela
A minha sepultura
Entrei numa gruta
Matei um tritão
Mas tive
O diabo na mão

Havia um comboio
Já pronto a largar
E vi
O diabo a tentar
Pedi-lhe um cruzado
Fiquei logo ali
Num leito
De penas dormi
Puseram-me a ferros
Soltaram o cão
Mas tive o diabo na mão

Voltei da charola
De cilha e arnês
Amigo, vem cá
Outra vez
Subi uma escada
Ganhei dinheirama
Senhor D. Fulano Marquês
Perdi na roleta
Ganhei ao gamão
Mas tive
O diabo na mão

Ao dar uma volta
Caí no lancil
E veio
O diabo a ganir
Nadavam piranhas
Na lagoa escura
Tamanhas
Que nunca tal vi
Limpei a viseira
Peguei no arpão
Mas tive
O diabo na mão

("Chamaram-me Cigano", do álbum "Cantares do Andarilho")

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22 fevereiro 2006

Pedroto

Ontem, o Benfica derrotou, e bem, o Liverpool. Mas não vou falar do Benfica.
Talvez por estarem em despique uma equipa portuguesa e outra inglesa, lembrei-me de um célebre treinador português, José Maria Pedroto, o treinador que, no inicío da década de 70, no Vitória de Setúbal, melhor pensava e concebia uma estratégia para derrotar as equipas inglesas, numa altura em que era muito difícil consegui-lo. E ele conseguia. Mais do que uma vez.
E era um regalo, então, ver a rapaziada do Vitória - grande equipa! - dar autênticos festivais de bola, de pé para pé, progredindo no terreno como se executassem um bordado. E, por trás disto tudo, estava o dedo e a sagacidade de Pedroto, o "Zé do Boné", um grande, um enorme "imburrente"!
Depois, no Porto, foi o que se viu... Mas isso fica para depois. Agora, quero ver o Chelsea-Barcelona.

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21 fevereiro 2006

SNS

Uma feliz coincidência na paginação do Público de hoje permitiu a junção, em páginas seguidas, de dois textos de opinião sobre o Serviço Nacional de Saúde (SNS). Um, de Vital Moreira, outro, de um neurocirurgião do hospital de S. José, em Lisboa, Coriolano Magalhães, na rubrica "Cartas ao Director", ambos se debruçando sobre aspectos do financiamento do SNS.
Do artigo de Vital Moreira retive um excerto que, pela sua natureza lapidar e sapiencial, não resisto a transcrever: "(...) Entre as coisas certas da vida, para além da morte e dos impostos, está portanto o aumento das despesas de saúde."
Ora, é precisamente de uma situação de despesa, a do gasto com o transporte de doentes para consultas de especialidade em ambulatório, que a carta do nosso médico versa. E são surpreendentes algumas das afirmações que ele faz. Só para reter a mais importante, fiquei a saber que, na maioria das especialidades, era perfeitamente exequível que os respectivos especialistas se deslocassem aos hospitais distritais das áreas mais afastadas para fazer consultas que a procura justificasse. Com este esquema, escrevia ele, as vantagens seriam vantajosas, sobretudo para os doentes, mas também para os médicos, pelo menos do ponto de vista material.
Parecendo-me evidentes os benefícios desta medida, é claro que me interrogo: se é assim, porque é que não é aplicada? Será que não é bem assim, e o médico tem uma visão deturpada desta realidade? Será que os especialistas não estão para isso? Ou, como ele também escreve, a verdadeira razão, para que isto se processe desta forma, terá a ver com a necessidade de subsidiar os serviços de bombeiros, que têm no transporte de doentes uma fonte de financiamento apreciável?... Fica a interrogação. Quem quiser, que responda.

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20 fevereiro 2006

Futebol

A vitória do Porto sobre o Marítimo não me convenceu. O espectáculo foi para o fracote. Valeu o golo do Raul Meireles, dois ou três passes do Lucho e pouco mais. Assim, duvido que se possa ganhar o campeonato. Aguardemos.
Um dia tinha que ser - falar de futebol. Será que estaria escrito nas estrelas, como diria o outro?...

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19 fevereiro 2006

Cinema

Já não vou ao cinema há algum tempo - demasiado tempo, direi.
Habituei-me a ir ao cinema na província, já lá vão vários anos. Lembro-me desses dias: da visualização dos cartazes, colocados estrategicamente junto da bilheteira, da sessão única - aos sábados, habitualmente - e do que os filmes nos faziam sonhar ou aspirar. Naquele contexto social e geográfico, as idas ao cinema representavam a possibilidade de fruir um momento de pura diversão e encantamento e, também, de reflexão sobre a vida. Eram momentos únicos e mágicos!
A mudança para a grande cidade veio dar um outro impulso a este gosto pelo cinema, que se mantém, apesar da concorrência feroz do comodismo e da omnipresente televisão. Mas o cinema vai vencer, tenho a certeza. Em cartaz, estão alguns filmes à minha espera. Penso que não vou resistir ao convite.

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18 fevereiro 2006

Emigrantes

Como nunca o fui, desconheço o que significa ser emigrante num país estrangeiro. Não serei, por isso, uma fonte credenciada para falar sobre essa realidade. Contudo, vou fazê-lo. E a razão é a seguinte: arrematei uma pequena obra a um trabalhador emigrante, de nacionalidade brasileira, aproveitando o facto de ele ter vindo a, progressivamente, ser como que o nosso artista dos sete instrumentos para todo o tipo de pequenas obras a fazer no prédio ou nas fracções dos condóminos. E o homem faz isso nos fins de semana ou feriados, naqueles períodos que deveriam ser os do merecido descanso, uma vez que já trabalhou toda a semana.
Este nosso homem tem-se imposto pela simpatia, pela qualidade e profissionalismo no que faz e, também, por uma grande humildade - que, de tão grande e fora do comum, chega a ser comovente. Que diferença em relação a muitos dos nossos compatriotas do ramo em causa, o da construção civil: boçais, tortos, profundamente aldrabões e incompetentes!
Como nos esquecemos rapidamente do nosso passado - e do futuro também, quem sabe... - de emigrantes nas sete partidas do mundo! Será que este exemplo poderá ajudar a relembrá-lo?...

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17 fevereiro 2006

Nomeações

Muita coisa já se disse - e continuará a dizer - sobre a administração pública portuguesa, os seus funcionários e dirigentes e o Governo. Umas vezes de forma acertada, outras nem por isso, este é um dos temas preferidos dos portugueses, por boas ou más razões, não havendo praticamente ninguém - incluindo os funcionários, obviamente - que não tenha uma opinião ou solução milagrosa, original ou evidente, para resolver, encaminhar ou desbloquear os problemas e os desfasamentos na administração pública. E há remédios para todos os gostos e maleitas.
Um dos mais utilizados destes remédios consiste na substituição de pessoas, designadamente, chefias máximas, garantindo um grande impacto mediático e fomentando o alvoroço nos corredores e nas salas das instituições envolvidas..
Ainda hoje, praticamente todos os jornais destacavam a substituição da chefia máxima num organismo público, após - imagine-se (!) - um esforçado e prolongado mandato de... nove dias!!
Ora, aqui está um bom exemplo de uma escolha "sensata", "ponderada", e "preocupada com o serviço público"!
Mais uma vez, como diria a minha vizinha: - Mãe Santíssima!!!

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16 fevereiro 2006

CIRC

Hoje, razões de ordem profissional levaram-me à leitura de alguns dos artigos do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (CIRC). Um desses artigos, o 1.º, surpreendeu-me pelo seu teor - deveras curioso, no mínimo.
Reza assim o dito artigo, sob o título "Pressuposto do imposto":
"O imposto sobre o rendimento das pessoas colectivas (IRC) incide sobre os rendimentos obtidos, mesmo quando provenientes de actos ilícitos, no período de tributação, pelos respectivos sujeitos passivos, nos termos deste Código."
Quando li isto pela primeira vez, confesso que me deu vontade de rir. Pensei: lá está outra vez o engenho e a visão portuguesas - neste caso, do Fisco - a mostrarem ao mundo como é que se pode ser eficaz, abrangente e justo em matéria fiscal. Estava visto: só mesmo nós é que antevíamos a possibilidade de, num futuro próximo, convidarmos toda a rapaziada envolvida nos negócios ilícitos a darem o seu contributozito para o aconchego das contas da Nação!
A não ser, que a razão seja outra. Mais subtil, talvez, ou profundamente enigmática, quem sabe?... Querem ver que, às tantas, as coisas ainda se compôem!?...




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15 fevereiro 2006

Luís Afonso

Agora que os cartoonistas estão na moda e que o impacto da sua actividade é por demais evidente - veja-se o caso dos cartoons de Maomé - apetece-me fazer uma daquelas afirmações bombásticas - será um termo apropriado, ou não?... - e que é a seguinte:
- Luís Afonso, autor, entre outros, do "Bartoon", no Público, é o melhor cronista do que é e o que significa o "ser português" na versão pícara, profundamente atenta à realidade nacional ou internacional.
Mais eficazes do que os discursos elaborados, redondos e retóricos de muitos comentadores, os cartoons de Luís Afonso revelam, numa penada, ao correr do traço e da leitura das legendas, uma apreensão clara do sentir e pulsar da sociedade portuguesa contemporânea, constituindo
um fino exemplo de um dos melhores estilos de humor português: subtil, cosmopolita e muito, muito inteligente.
E o homem vive em Serpa!! Se calhar, é por isso...

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14 fevereiro 2006

Impostos

A confirmar-se, a diminuição da taxa de retenção mensal do IRS parece-me uma boa notícia.
Para além de uma medida de inegável justiça, acho-a mais adequada para a gestão regular dos gastos das famílias. Agora, passa a haver mais disponibilidade financeira mensal, em vez de se estar à espera de uma eventual "prenda", lá para o Verão.
É, repito, uma boa notícia para os trabalhadores dependentes.

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12 fevereiro 2006

Festa

Correu bem, a festa de aniversário da C. Ela estava feliz e é o que interessa.
Foi um dia perfeito.

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11 fevereiro 2006

Amendoeiras

Hoje, lembrei-me das amendoeiras floridas. Talvez, por causa do calor. Ou simples nostalgia, quem sabe?...

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10 fevereiro 2006

Desertificação

A desertificação do interior é um dos problemas mais graves do país, sendo uma das consequências da falta de políticas correctas, sustentáveis e corajosas de ordenamento do território. No curto prazo, esta realidade terá que ser equacionada como prioritária nas opções de política e de investimento - quer se queira, quer não - por estar em causa a manutenção e a sobrevivência do País. Será um erro estratégico incomensurável não a situar no topo das nossas prioridades. Não o fazendo, todos o iremos pagar. Quer queiramos, quer não.

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09 fevereiro 2006

Jornais Gratuitos

Considerava os jornais diários gratuitos um produto menor e perfeitamente descartável. Fruto de desconhecimento e, quiçá, de alguma sobranceria, nunca acreditei que viesse a dedicar-lhes muita atenção ou interesse. Estava redondamente enganado!
Comecei a ler um jornal diário gratuito, o "Metro", com regularidade, há relativamente pouco tempo. Desse contacto mais frequente, fui-me apercebendo do profissionalismo de cada edição e do cuidado com o tratamento da informação, nacional ou internacional. Acho-o um bom produto editorial, cosmopolita, graficamente apelativo e claramente adaptado ao universo de potenciais leitores e ao tipo de vida nas grandes cidades. E com dimensão internacional, há que notar.
Como era de esperar, também as empresas olham para estes produtos com olhos interessados, canalizando para eles muito investimento publicitário e acções promocionais. Constato isto, quase todos os dias. E não estamos a falar de empresas de "vão de escada"!
Claramente, é um mercado em expansão. Os jornais pagos que se cuidem!...

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08 fevereiro 2006

Vigilância

Acabei de ver mais um episódio da série "24". Na série, uma das coisas que me fascina e surpreende, mesmo que seja do domínio da ficção, são as performances quase mirabolantes - ou talvez não ... - da utilização de sofisticados esquemas de vigilância, localização e detecção.
Saltando da ficção para a realidade portuguesa, incomparavelmente mais rica, dei-me conta de uma notícia que, de tão bizarra, era digna de emparceirar com os chamados "fenómenos do Entroncamento": desde 2003, a fazer fé no jornal que a divulgava, o Ministério da Defesa português não dispunha de qualquer sistema de videovigilância no edifício, por os sistemas terem deixado de funcionar. O Ministério da Defesa, note-se, não uma qualquer repartição de venda de impressos!
Parafraseando uma minha vizinha, eloquente na sua expressividade: "Mãe Santíssima!!!"

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07 fevereiro 2006

Declaração

O Governo português, através do ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, assumiu uma posição oficial sobre a crise dos cartoons de Maomé. Essa posição, sob a forma de declaração, está disponível no portal do Governo, para quem a quiser conhecer.
A leitura da declaração não deixa de provocar alguma perplexidade, quer pelo seu teor quer pela oportunidade, mesmo aceitando que ela se insere numa estratégia diplomática de contenção e controlo de danos.
Porquê agora e nestes termos, pergunta-se? Será que corríamos o risco de ninguém reparar em nós?...
A sensação que permanece é a de que, mais uma vez, as exigências da "Realpolitik" prevaleceram. Se calhar, não havia necessidade.

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06 fevereiro 2006

Retrato

Li hoje, no "Público", uma entrevista de Maria Helena da Rocha Pereira, uma das nossas mais ilustres especialistas em cultura clássica.
Afirma ela, a dado passo, o seguinte: "(...) Falta - como hei-de chamar - a tendência para trabalhar para nós e para todos. Isto é, para a melhoria de todo o país e não apenas para a nossa própria. A aplicação ao trabalho infelizmente é muito deficitária no nosso país. Estou a dar outro nome àquilo que vulgarmente se chama preguiça. A nossa preguiça impede o desenvolvimento do país".
Eis aqui, com simplicidade e elegância, um retrato lapidar de um país: o nosso!

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05 fevereiro 2006

Rótulos

Sinal de apreço, manifestação de regozijo ou simples comemoração são algumas das situações em que se pode oferecer um vinho como prenda. É um gesto que enobrece quem dá e dignifica quem recebe.
Num mercado competitivo como o dos vinhos, os produtores recorrem à publicidade e às estratégias de promoção para garantirem quota de mercado para os seus produtos, numa busca incessante para chamar a atenção de potenciais consumidores. Mas, ninguém se iluda, se os vinhos não forem bons, nada a fazer! Já foi tempo! Agora, acho difícil.
Um produtor de vinhos português está a promover alguns dos seus vinhos com o recurso a um expediente publicitário interessante - a possibilidade de os consumidores poderem vir a personalizar os rótulos.
Caso esta prática não esteja ainda generalizada, o que desconheço, acho que ela tem todos os requisitos para que o venha ser, a breve trecho.
Assim, para quem possa ter acalentado o sonho de, alguma vez, oferecer um vinho em que queira deixar um "toque pessoal", mais durável no tempo, para além do gesto implícito no acto da oferta, já sabe: alguém, pelo menos no mundo dos respectivos produtores, pode ajudá-lo.
Os consumidores agradecem.

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Frase

Sujeito predicado complementos.

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03 fevereiro 2006

PRACE

A cumprir-se o previsto, faltará um mês, mais coisa menos coisa, para que se conheça com mais detalhe o "PRACE" (Programa de Reestruturação da Administração Central do Estado).
Não me parece difícil prever que esta sigla ficará muito conhecida e dará azo a muito comentário, opinião, dissertação ou tomada de posição. A ver vamos.
Não sabe o que é o "PRACE"!?... Não faz mal.
Em Março se saberá.

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02 fevereiro 2006

Aplauso

Para Teixeira dos Santos, ministro das Finanças, pela sua afirmação sobre a retirada de benefícios fiscais a contribuintes faltosos ao fisco. A frase, citada num jornal gratuito, o "Metro", é esta: "Essa é uma orientação que tem vindo a ser seguida por parte dos serviços de impostos. Não vejo onde é que está o problema. A não ser que se ache legítimo que alguém que não cumpra as suas obrigações fiscais possa também ter benefícios fiscais ao mesmo tempo".
Não podia estar mais de acordo, embora me surpreenda por só agora isto estar a ser noticiado. Será que é uma prática recente? Se sim, é inexplicável.
Em todo o caso, em nome da justiça fiscal ela é bem-vinda. Até apetece dizer: - "Elementar, meu caro Ministro!".

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01 fevereiro 2006

Presidenciais

Agora que toda gente - ou quase - já deu a sua opinião sobre as presidenciais, aqui fica também a minha, sob a forma de notas:

1.ª) Nas eleições em Portugal, a escolha dos eleitos está mais dependente das emoções do que da razão. Votantes ou abstencionistas, uma grande parte das pessoas não está muito interessada ou motivada para conhecer, debater ou subscrever propostas ou projectos. Vota de acordo com uma grelha de antinomias que remetem para o domínio do emotivo: gostar/não gostar; simpatizar/antipatizar; novo/velho; familiar/estranho; militante/diletante; correlegionário/não correlegionário. A eleição presidencial não escapa a este quadro, antes o acentua.

2.ª) Cavaco Silva ganhou as eleições para a Presidência da República, à primeira volta, mantendo-se fiel a uma estratégia, definida ao milímetro, caracterizada pelo não comprometimento. Para quem não se assumia como "político profissional", nada mal, não senhor! Literalmente não "deu Cavaco" aos restantes candidatos, que variados esforços fizeram para o trazer à disputa. No que me diz respeito, passa a ser (é) o Presidente da República de Portugal. Ganhou e está legitimado eleitoralmente. Ponto final.

3.ª) Os portugueses dificilmente se libertam da tentação do "sebastianismo". A escolha de Cavaco Silva aí está para o provar. Mas se fosse outro o escolhido - qualquer que ele fosse - será que essa tentação permaneceria? Penso que sim. Com qualquer um deles, ainda que assumindo formas e matizes diversos.

4.ª) Foi um choque o resultado eleitoral de Mário Soares, designadamente para o próprio. Estou convencido que se candidatou, entre outras razões, na plena convicção de que, qualquer que fosse o opositor, a vitória estaria mais ou menos garantida, com mais ou menos esforço, idealmente numa segunda volta, para culminar de forma épica. Seria o coroar de uma carreira política notável, com um último combate com um adversário de respeito, Cavaco Silva, apresentado como vencedor antecipado durante muito tempo. Será que este excesso de optimismo não se teria ele próprio virado contra Soares? Tenho quase a certeza. A História, mais uma vez, não se repetiu.

5.ª) Os resultados de Manuel Alegre surpreenderam muita gente, se calhar até ele e os seus apoiantes. Quais as razões para que isto tenha acontecido? Eis algumas: a valorização da imagem de resistente e de criador e potenciador de sonhos; algum desencanto com os resultados da prática governativa e com o processo de escolha do candidato do seu partido; a carga simbólica e o imaginário, acentuadamente de cariz patriótico, que perpassou no discurso e nas acções de campanha. Ganha uma legitimidade que ultrapassa as fronteiras do seu partido, devendo contudo, na minha opinião, não a sobrestimar. O resultado é fruto de circunstâncias que não se repetirão, sendo, por isso, efémero. A ideia do movimento cívico, aparentemente já instaurado, não sei se terá pernas para andar. Para além disso, recordar o que aconteceu a Mário Soares talvez não seja despropositado...

6.ª) Jerónimo de Sousa afirma-se como um verdadeiro fenómeno. Para o Partido Comunista é uma clara mais-valia eleitoral e mediática. À sua escala, foi um dos vencedores.

7.ª) Francisco Louçã deve estar decepcionado. Muito boa preparação, imagem mediática favorável, militância e combatividade não foram suficientes para alcançar o que se tinha proposto: impedir a vitória de Cavaco Silva e ficar à frente de Jerónimo de Sousa. Foi um dos derrotados destas eleições.

8.ª) Uma palavra para Garcia Pereira: a militância continua!

9.ª) A abstenção foi muito significativa, permanecendo um indicador preocupante sobre o estado do País. Não é ainda um alerta suficiente para a tradicional forma de fazer política?...

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