28 fevereiro 2010

O caixote do lixo

Parecia ser um dia de trabalho igual aos outros. Apesar do vento, que nesse dia soprava com uma força que se fazia notar, nas pessoas e nos objectos, todas as rotinas diárias típicas dos dias de trabalho - levantar, ir ao pão, tomar o pequeno-almoço e rumar para o trabalho - se mantinham, aparentemente inalteráveis. Pelo menos, era o que ele pensava.
A caminhada levava já alguns minutos e a distância percorrida estimava-a em termos horários, dentro dos limites e do controlo que tinha estabelecido para o percurso, mantendo-se fiel aos seus hábitos e modelos organizativos, para ele necessários.
Deslocava-se com alguma dificuldade, aconchegado ao sobretudo (já um pouco coçado, comprado numa feira de província, em tempos), pois, como se disse, nesse dia o vento fazia-se sentir e o nosso amigo sentia-o, recordar-se-ia mais tarde...
A surpresa, pois de uma verdadeira surpresa se tratava, apanhou-o num momento de reflexão com os seus botões, momentos também típicos do seu dia-a-dia, banal, repetitivo e corriqueiro. Mas alguma coisa iria mudar.
A princípio não se apercebeu, tão absorto que ia, mas algo instintivo o alertou, como se algo que há muito estava adormecido, porque desnecessário, resolvesse mostrar a razão da sua existência e porque é que era um mecanismo que, desde sempre, zelara e ajudara a manter a espécie.
Era bizarro e, sobretudo, inquietante - lembraria, mais tarde - que um objecto familiar e inanimado, supostamente inócuo e com o qual se cruzava todos os dias, pudesse assumir contornos e uma faceta agressivos, dignos das melhores histórias sobre «mitos urbanos». Acreditando ou não em mitos urbanos, o facto é que o nosso cidadão comum iria vivenciar uma experiência fantástica, daquelas em que não se acredita e, muitas vezes, se põe em dúvida a própria sanidade mental de quem a protagoniza ou julga ter protagonizado.
Passava no passeio e, de repente, aquele instinto adormecido agitou-se e fê-lo desviar-se de algo que se precitava na sua direcção com intuitos ameaçadores, bramindo uma agressividade insuspeita e amedrontadora, dada a sua natureza, até aí aquietada, de objecto inanimado.
Num ápice, desviou-se. A sua respiração sobressaltou-se, mas conseguiu controlar-se e olhar de frente para o «agressor», que só agora descortinava e a quem media a distância, disponível para se defender ou, se necessário, atacar. Estava pronto.
Na estrada, os automóveis faziam-se ao caminho, cegos ao drama que se verificava a poucos metros, no passeio, concentrados no asfalto e nos sinais de trânsito, ciosos do seu lugar nas filas intermináveis.
Mas o que o tinha «atacado», afinal? (perguntava-se), enquanto recuperava da surpresa e o seu corpo se retesava com cargas de adrenalina, necessárias para o «confronto»: um caixote do lixo!!!... Sim, um caixote do lixo, pasme-se!
O que é certo, é que o nosso homem nunca mais foi o mesmo. Embora algumas pessoas lhe tivessem explicado o que real e verdadeiramente tinha acontecido - uma conjugação aleatória de factos banais, como eram o arrastar de um caixote de lixo (vazio, ainda por cima) por uma rajada de vento mais forte - nada o fazia o demover nem renegar a sua experiência traumatizante, dizendo, concludentemente: - «Podem ter razão, mas quem foi atacado foi eu!».
Nunca mais foi o mesmo.
Ainda agora, passado tempo suficiente, mesmo em dias de sol radioso e sem vento, nunca mais a visão de um caixote de lixo deixou de o atormentar... Haja outro Hitchcock - se é que isso é possível... - e a trama de «Os Pássaros» ainda tem um remake ... Sob a forma de um caixote de lixo!...

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27 fevereiro 2010

Invictus

«Invictus», de Clint Eastwood, com Morgan Freeman, é um filme cuja apreciação, parece-me, pagará sempre um preço elevado face ao peso da história e da dimensão de uma personalidade como Nelson Mandela. Com isto, quero dizer que «Invictus», sendo um filme de Eastwood e tendo Freeman como protagonista, nunca seria um mau filme (e não é, de facto), dada a qualidade destes dois «rapazes», mas tem como grande handicap, por incrível que pareça, o facto de retratar um episódio real, até com alguma coloração épica, da história da África do Sul, mas sobretudo por ficar quase que «paralisado» perante a «personagem» Nelson Mandela!
Sobre quem continuo céptico é sobre Matt Damon. Deve ser defeito meu, com certeza, mas continuo a não me desligar da personagem «Jason Bourne», a que melhor se lhe «encaixou», para mim, mas que me deixa alguma sensação de desapontamento na maioria das outras, como a deste filme, em que se calhar haveria alguma possibilidade de lhe dar mais «gás», ganhando com isso uma maior credibilidade para o papel que desempenha. Estarei a ver bem e, também aqui, Clint Eastwood poderia ter ido mais longe?...

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Dá tudo certo!

Para mim, há sempre uma sensação confortável em ver e regressar a um filme de Woody Allen. Uns filmes mais acarinhados do que outros, é um facto, mas sempre uma (re)visitação agradável. Foi o que se passou, mais uma vez, com o seu mais recente, «Tudo pode dar certo». Há uma predisposição favorável, reconheço, mas que facilmente se aceita e subscreve, porque gosto da forma como Allen conta as suas histórias ( e ele é um contador de histórias) e dá vazão às suas perplexidades, interrogações, fobias e outras coisas que tais, como a inteligência, por exemplo. Lá no fundo, penso que Allen quer e esforça-se para conquistar os seus espectadores, seja pela fidelidade aos seus temas e formas de os expressar, seja pelos diversos «artifícios» de que se socorre - pelo «seu» alter-ego, Larry David, (excelente!), pelas suas «heroínas» (a mãe e a filha), e mesmo pelos «secundários», que são os amigos» e os parceiros, femininos ou masculinos - assim como o «passe de mágica» que constitui a descoberta de David a «dialogar» para os espectadores: se isto não é uma tentativa de obter a sua «cumplicidade»?!... E nós vamos atrás.
«Tudo pode dar certo», pois, para que o filme se transforme num filme de «final feliz». E isso, convenhamos, também constitui uma das «magias» do cinema. Que, me parece, Allen procura sempre nos seus filmes, mesmo que, às vezes, se possa pensar o contrário.

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24 fevereiro 2010

Mestre

É uma caixinha de memórias e de surpresas, este You Tube! Desta vez, um grupo, Petrus Castrus, e uma música, 'Mestre', que já não ouvia há que tempos!...

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Cromos (actualização)

... E «Miami Vice», «As Petazetas»,...

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21 fevereiro 2010

Cromos

Já tinha ouvido falar do programa, mas só hoje é que ouvi algumas das crónicas do programa «Caderneta de Cromos», de Nuno Markl, na Rádio Comercial. Pela amostra, as crónicas transformam-se num pagode permanente, com o jeito e o estilo do Markl, que funcionam muito bem na rádio. Das crónicas que ouvi, as dedicadas à «Pulseira Tucson», às «Aulas de Educação Física», às «As canetas com senhoras desnudadas», aos «Jogos sem Fronteiras» e à «Revista Gina» são um must. Haverá mais, certamente. É ouvir.

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14 fevereiro 2010

Pontapé de ressalto

Por espírito patriótico ou curiosidade, lá fui convencido pelo seleccionador nacional da modalidade a ir parar ao Estádio Universitário para ver o jogo de râguebi entre Portugal e a Geórgia, que estes ganharam por 16-10. Se calhar também pela nostalgia de ver jogos no estádio em vez de na televisão, apesar de a opção pelo râguebi ser uma novidade. Lá fui, então, até porque o dia estava bom e bonito e gosto do local onde aquilo iria desenrolar-se.
A minha informação sobre o râguebi mais não é do que rudimentar, exclusivamente adquirida pela visualização televisiva, com realce para os jogos do Torneio das 5 Nações, que bastas vezes me ajudaram a passar as tardes de sábado de outrora. Foi pouco como conhecimento adquirido, é certo, mas ficou algum interesse pela modalidade, mesmo sem a praticar: era e sou um pequeno «praticante de bancada», condição aliás que vou estendendo a outras modalidades, mesmo naquelas em que me sinto mais próximo ou envolvido.
Lá estava eu, pois, a tentar perceber o desenvolvimento do jogo, as regras e as faltas, a ver se a minha presença e a de outras pessoas contribuía para uma vitória da selecção portuguesa, na esperança ingénua de que o apoio à selecção fosse assumido de forma mais genuína do que costuma acontecer nos encontros das outras modalidades, em que o entusiasmo acontece quando as coisas correm bem e não quando as coisas correm mal. Pelo que vi, no entanto, a maleita é mesmo congénita, uma vez que a atitude se mantém, basta estarmos na mó de baixo. Só para se ficar com uma ideia, quinze ou 20 georgianos presentes fizeram mais barulho e manifestaram mais entusiasmo que as centenas de tugas presentes, mais ou menos identificados com a modalidade.Tudo se ficou pelo cantar do hino e alguns «avantes!» arrancados aos soluços, sobretudo quando a equipa dava mostras de algum assomo mais entusiástico, o que se verificou sobretudo na segunda parte. Na primeira parte, até eu percebi, os rapazes da Geórgia levaram sempre a melhor. Para compor o ramalhete, também não acertámos com os pontapés e isso podia ter ajudado a ganhar o jogo. Quanto aos incentivos (mais menos do que mais, diga-se de passagem), fiquei até com a impressão de quem mais puxava pela equipa eram os «cristãos novos» como eu... Para quem tinha idealizado um ambiente e um estado de espírito diferente na forma de viver esta modalidade... Houve algum desencanto, é um facto!

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Para que servem os passeios?

Ainda são poucos, mas começam a ver-se em Lisboa ciclistas a partilharem as vias de trânsito com os automóveis. Não deixa de ser uma medida temerária, dadas as condições em que se deslocam. E essas dificuldades talvez expliquem a opção que muitos desses ciclistas fazem, que é a de circular nos passeios, quando isso se torna mais cómodo e/ou seguro. Mas isso não se faz sem riscos, desta vez para os peões. Mais uma vez, é de uma clássica situação de a minha liberdade poder interferir com a liberdade dos outros. E o que se diz dos ciclistas, também se pode estender a outras opções mais radicais, como os patins, os skates e outros. Quanto aos ciclistas, embora compreenda a sua opção (mais segura) pelo passeio, é conveniente que as coisas não descambem e que, no limite, não passe a haver uma versão do Código da Estrada aplicável aos passeios, espaços que, cada vez mais, são usufruídos por todos, menos pelos seus verdadeiros destinatários: os pedestres.

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05 fevereiro 2010

Empurrar com a barriga

Com o episódio de hoje relacionado com a aprovação da Lei das Finanças Regionais, duvido que haja quem não esteja já resignado a que, a breve trecho, voltemos a ter eleições antecipadas, por óbvia falta de vontade ou incapacidade de quem tem responsabilidade política para fazer o que deve ser feito em vez do que se tem feito até aqui, que é empurrar com a barriga os problemas e as dificuldades, numa espiral de birras de meninos mais ou menos amuados e/ou mal habituados. Assim, não vamos lá. Estamos feitos!

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