26 junho 2011

Columbo

Pela imprensa, fico a saber da morte de Peter Falk, o «inspector Columbo». Com o seu ar descuidado e quase maltrapilho, vestindo uma gabardina coçada e de charuto rasca nos beiços ou na mão, parecendo pedir desculpa por ser como era e por fazer o que fazia, lembro-me bem desta personagem de série policial - um clássico, estou certo - uma espécie de não-herói, mal enjorcado, distante da imagem habitual dos protagonistas neste género de filme, mas que, talvez por isso, fascinante e responsável pela grande adesão das audiências, iluminados pelas suas desconcertantes performance e inteligência, torcendo e comprazendo-se, no seu íntimo, pelas vitórias do inspector e a derrota dos «vilões», seus vangloriados opostos, reconhecidos e convencidos. Quem, dos espectadores e apreciadores da série, nunca se terá deliciado com o brilhantismo e os resultados alcançados pelo «patinho feio», por oposição aos «cisnes» que se lhe opunham e, sem excepção, o subestimavam?... Até sempre, Columbo!

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19 junho 2011

Ovo Kinder

Conhecido o novo Governo, para além das escolhas e dos comentários retive a expressão «governo ovo Kinder», da autoria da jornalista Ana Sá Lopes, do i, no editorial de sábado. É uma expressão feliz para caracterizar as expectativas acerca do Governo, versão urbana e contemporânea da mais rural e popular sobre a qualidade dos melões. Para quem conhece  o que são e o que representam os ovos Kinder - não só para as crianças mas também para os adultos... - de certo concordará comigo com a pertinência e o acerto da expressão.

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16 junho 2011

«Undercobe»

Todos sabiam que não o era, a começar pelo próprio. Eriçava-se quando o tratavam assim, «espião», deixando escapar uns maldizentes vernáculos sobre a honra maternal dos interlocutores, embora lhe passasse rapidamente a azia - «consequência do treino», afiançava. Quando isso acontecia, contudo, a reacção era habitual: rapidamente desaparecia da circulação e só voltava a aparecer dias depois, mais misterioso e desconfiado, consciente de que tinha sido necessário apagar indícios e «abortar a operação», justificava-se aos mais próximos.
Seja como for, «espião» ou «agente secreto» - «undercobe agent», sussurava, entre dentes, numa mal assimilada pronúncia anglo-saxónica, menos «anglo» e mais «saxónica», note-se - era uma personagem que se evidenciava pelo estilo e pela pose, ambas nada dadas ao «encoberto».
Primeiro que tudo, na indumentária: espampanante era eufemismo, tal a combinação cromática! Aliado a esse pormenor - «técnica de dissimulação», jurava a pés juntos - uma parafernália de quinquilharia (antenas, rádio a pilhas, auricular, canivete chinês, cassetes de feira, colunas e mochila), justificada como «gaijetes de vigilância», faziam do nosso «undercobe» um dos personagens mais requisitados pelas máquinas dos turistas, visitantes ocasionais e tranquilos cidadãos despreocupados. O que, para ele, era bom: sempre pingavam umas moeditas e, nos melhores dias, uma ou duas notitas - «para manter o disfarce», filosofava.
Um dia, «undercobe» estava mais agitado do que o costume. Andava de um lado para o outro, com as abas da gabardina levantadas - sim, ele tinha uma gabardina e usava as abas levantadas... - e olhava, de soslaio, para cada um dos lados da rua, aproximando-se subrepticiamente de nós, simples e visíveis mortais, com a sacramental pergunta: «Papa uóse um rolin estone?», questionava uma e outra vez: «Papa uóse um rolin estone?»... e nós, nada. Auto-convencionara o seu santo e senha, mas sem grande adesão dos «não-iniciados» na arte da espionagem, pelo menos na versão do nosso «urdercobe». Ainda hoje, passados estes anos, já sem dentes e mais encurvado pelo cacimbo e pelo álcool, continua na sua árdua e contínua demanda junto dos passeantes, dos «paisanos» em linguagem «urdercobe», murmurando, como quem não quer coisa: «Papa uóse um rolin estone?»... Se calhar, «who nouse?»...

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11 junho 2011

Zeca

Ontem, passou na TV2 um documentário sobre José Afonso. Infelizmente, só o apanhei já a meio. Na parte dedicada ao concerto que deu no Coliseu, em 1983, quando já estava muito doente, a interpretação da 'Balada de Outono', sobretudo do excerto «...águas das fontes calai, ó ribeiras chorai que eu não volto a cantar...», é um momento que comove e arrepia, ainda hoje.

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O que se segue?...

Do ponto de vista formal, sabe-se que, em Portugal, as eleições legislativas se destinam a eleger deputados e não primeiros-ministros. Na prática, não é isso que se verifica. Como se comprovou mais uma vez, nas eleições de 5 de Junho, mais do que as questões ideológicas ou programáticas, o que sempre esteve em cima da mesa era a avaliação sobre o primeiro-ministro, José Sócrates. Goste-se ou não se goste desta constatação, para mim foi evidente que uma das principais decisões - se não a principal - destas eleições era evitar a continuidade do primeiro-ministro cessante, situação comparável à que já se tinha verificado em 2005, com Santana Lopes, sendo bom que o vencedor das eleições, Passos Coelho, tenha presente este facto, pese embora o êxito que lhe deve ser atribuído -atentos os resultados - das suas apostas e/ou opções no desfecho eleitoral. Veremos o que se segue.

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05 junho 2011

A propósito da cidadania

Na edição de fim-de-semana, o i publicou um caderno com a transcrição do MoU, pontuado e complementado com algumas notas e observações para mais facilmente se tentar perceber o que está em causa e quando, como e para quê. É um suplemento muito útil, parece-me, ajudando a enquadrar e a perspectivar o que nos espera ou podemos esperar, contribuindo para desmontar uma muito nossa característica de dizer que «se desconhecia» ou de que «não fazíamos ideia»... Já que se fala tanto nas questões de cidadania e nas diversas formas de envolvimento dos cidadãos para além do acto de votar ou do questionamento dos partidos, por que não começar por aqui, pelo MoU, e ver como é que ele é cumprido ou concretizado, procurando seguir o calendário e o elenco de medidas nele constantes, tentando apreender o grau de envolvimento e de compromisso com o seu cumprimento. É um desafio que se coloca a todos, sem excepção. Pensar o contrário é iludirmo-nos.

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Não é para todos...

Portugal ganhou à Noruega (1-0) e colocou-se no 1º lugar do grupo, voltando a estar dependente de si próprio para a qualificação. Para quem não esteja a acompanhar a fase de qualificação pode parecer pequena coisa, mas não o é, atendendo à forma como as coisas começaram, na fase Queirós. Com Paulo Bento, as coisas voltaram a ganhar credibilidade e deixou, pelo vistos, de se andar permanentemente «nas bocas do mundo» por más razões futebolísticas. Sobre o jogo de ontem, porém, as coisas não foram fáceis, uma vez que a Noruega se defende muito bem e causou alguns calafrios nos contra-ataques. Mérito também para Postiga, esse «patinho feio» da área - e não percebo porquê... - autor de um golo que não é para todos..., e numa altura da época em que os jogadores querem e precisam de férias. Também aqui, Paulo Bento terá mérito.

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04 junho 2011

O treinador Villas-Boas

A época futebolística já acabou há algum tempo, mas só agora me dá para fazer um comentário sobre a campanha e as vitórias alcançadas pelo Porto: Supertaça, Campeonato (sem derrotas), Taça de Portugal e Liga Europa, numa final portuguesa, com o Braga. Dificilmente repetível, é uma época extraordinária e não é de mais enaltecer o mérito do treinador Villas-Boas, uma arriscada aposta assumida por Pinto da Costa que correu muito bem. Penso que uma agradável surpresa para quem olhe para isto de forma isenta - comigo, por exemplo, as expectativas eram baixas... -, gostei particularmente da sua forma de estar, ver e sentir o futebol e o que o rodeia, sem as bacoquices ou as prosápias típicas dos protagonistas que por lá gravitam. Os resultados foram evidentes e significativos, não deixando margem para contestar ou pôr em dúvida o mérito e a competência do homem. Então e os jogadores - dirão muitos - não contam?! É claro que sim, uma vez que eles é que marcam ou sofrem os golos. No entanto, convenhamos, alguma coisa deve ter que ser imputada ao técnico, em última instância quem define a forma como se joga, se altera ou se modifica o curso de um jogo, algo que pode correr mal, muito mal. E, nalguns momentos da época, por exemplo nas vitórias sobre o Braga, em casa, e sobre o Benfica, primeiro na Supertaça, nos 5-0 da 1.ª volta e nos 1-2 da 2.ª, e na reviravolta da eliminatória da Taça (sobretudo neste), alguma coisa deve ter acontecido que deve ter tido o dedo de Vilas Boas, pois não acredito que a auto-motivação e a forma dos jogadores chegassem. Poderá dizer-se agora, sem margem para dúvidas, que a grande «contratação» do Porto foi, precisamente, André Villas-Boas!

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Para entender os portugueses

Um dos cronistas do i, Paulo Maló, ligado à medicina dentária, se não estou em erro, escreveu ontem uma deliciosa crónica, intitulada «A sul», sobre a forma como deve ser interpretado, em Portugal, o sentido de algumas frases relacionadas com o trabalho e a intervenção do trabalhador. Transcrevo essa parte, carregada de uma ironia fina, que de nós diz muito, neste particular:
"«Já comecei a fazer» significa que ainda não começou;
«Faço já», vai fazer dentro de algum tempo;
«Está a ser tratado», nada foi feito ainda;
«É complicado», não lhe apetece fazer;
«Estamos a estudar o assunto», esqueceu-se completamente do caso;
«Ouvi dizer», quer conversa da treta;
«Isso é difícil», quer ser compensado por resolver;
«Não sei se vou conseguir», uma desculpa se falhar;
«Vamos fazer com calma», não tem ideia de como resolver;
«A culpa não é de ninguém»... é dele!".
Como cartilha, não está mal. Realista?... Exagerada?... Seja o que for, digamos que, tal como nas sondagens, os resultados (e as apreciações, já agora) devem estar dentro da margem de erro...

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01 junho 2011

Já assobiámos hoje?...

Olhando para a forma como a campanha eleitoral está a decorrer, surpreende-me que haja alguém que ainda acredite que os principais intervenientes serão capazes de um entendimento razoável para conseguir cumprir aquilo a que se comprometeram e se têm as forças e as convicções necessárias... Até ver, as coisas não me parecem animadoras. Continuamos a «assobiar para o lado» e fazemos de conta de que não é nada connosco... até um dia. O problema é se os «emprestadores» do dinheiro deixam de achar graça «ao pagode». E aí é que vão ser elas!...

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