O meu primo Arlindo, executivo de uma multinacional e bom rapaz, fez anos. Fazendo 50 anos, quis uma comemoração do seu aniversário diferente das que costumava fazer e resolveu fazer um discurso para os seus convidados. Tendo uma relação difícil com as letras, sobretudo na componente redacção, pediu-me a mim, o seu primo mais chegado, funcionário de secretaria com algum jeito para a escrita, que lhe fizesse o referido discurso. Aceitei, claro, mas com duas condições: total liberdade criativa e autorização para o publicar aqui, no blogue. O que se arranjou foi o que a seguir se transcreve:
«Boa tarde! Eu sou o Arlindo e esta é a «Festa do Arlindinho».Começo pelos agradecimentos. É de bom tom - sim, que eu sou uma pessoa fina, culta e educada…- agradecer às entidades e às pessoas que tornaram possíveis a realização deste grande «evento», pois de um grande evento se trata, pensado e executado ao longo de muitos e árduos dias. Sem esse apoio, a festa não seria possível e, meus caros convidados, não haveria croquetes, pastéis de bacalhau, amarelinhas ou carrascão. Como podem ver, felizmente esfumou-se esse fantasma. Podem comer (alguma coisa), podem beber (pouco), podem divertir-se (muito).Agradeço, pois, à Junta Demarcada de Matarraque, Magoito e Alcabideche os copos de penalty de plástico, à Tasca do Careca, pelo sistema inovador de refrigeração, ao Clube Universitário «Não bebas água que te faz mal», pelo empréstimo das cartolinas on-line e ao Zequil (sim, ao Zequil!), que após uma prolongada expedição ao Quénia, onde se terá perdido e estabeleceu contacto com uma tribo de pigmeus adeptos fanáticos do Sporting, regressou de novo ao nosso convívio. Agora a sério. Tenho que agradecer, de forma personalizada, a três das pessoas envolvidas na organização da «Festa do Arlindinho». Essas, que me perdoem as outras igualmente envolvidas, foram aquelas que mais determinantes foram para que isto acontecesse. Mais do que ninguém, agradeço à Alzira, minha querida e paciente vizinha, cozinheira emérita e organizadora incansável, que tem feito o favor de nos aturar todas as bizarrias, como a de hoje, de forma sempre disponível e tolerante. Esta senhora teve uma trabalheira enorme para nos dar esta bela merenda, merecendo, por conseguinte, uma salva de palmas estrondosa. Obrigado, Alzira! Também à Becas e à Lecas, distintas decoradoras, pelo excelente trabalho que fizeram, pleno de irreverência, criatividade e bom gosto. Continuem, minhas lindas! O Arlindinho e os convidados agradecem e batem palmas. Já não é segredo para ninguém, suponho, que hoje faço 50 anos. Não me levem a mal a ênfase que dou ao meu aniversário, pois só estou a dar expressão àquilo que ele representa para mim: o dia mais importante do ano, ao qual nenhum outro se sobrepõe! É verdade: o dia mais importante do ano…, pelo menos desde que passei a ter consciência do que é que este dia representava para mim. E se, desde então, todos eles foram importantes, o deste ano, para além de importante, quis que fosse especial. E, com a vossa ajuda, ele tornou-se, de facto, verdadeiramente especial. Para que isso fosse possível, não precisei de fazer grande alarido, mover influências ou pôr-me em bicos dos pés. Limitei-me a convidar-vos, apenas. Também é verdade que tive que vos dar de comer e beber…, mas isso faz parte das regras do jogo e eu aceito-as. Diria mais: tive muito gosto! Hoje faço 50 anos e estou duplamente feliz: por ter chegado a fazê-los e por ter podido juntar-vos para os comemorarmos. Cá vos espero e conto convosco para comemorarmos os 100 anos… Hoje, aqui, consegui reunir comigo várias «famílias». E quando digo «famílias» não quero apenas referir-me ao seu significado mais comum, o do universo dos parentes. Não, meus queridos amigos e convidados! Muitos dos que aqui estão sabem que não são meus familiares no sentido tradicional da palavra, o da relação de parentesco, mas, mesmo assim, para mim é como se fossem isso mesmo: família. Mais do que pelo sangue, tenho aqui comigo muitas pessoas que constituem a minha outra família, (diria melhor, as «minhas famílias»), aquelas que se constituem e cimentam pelos afectos. E é isto que me dá uma satisfação maior. Estas famílias, que têm o afecto como seu elo de ligação comum, não costumam escolher ou circunscrever o seu território ou os seus membros. Não! E a prova disso está aqui, hoje. Fazem parte destas famílias do afecto, das «minhas famílias» do afecto, pessoas com personalidades e feitios diferenciados que, de alguma forma, se cruzaram comigo ou com a minha vida: na família, na vizinhança, na escola, no emprego ou em qualquer outra circunstância. Falo, pois, de «famílias» geradas nos e pelos afectos e entretecidas pela cumplicidade, servindo de exemplo pela diversidade, riqueza e complementaridade. Algo nos juntou e fará continuar a juntar, estou certo, pois estas diversas «famílias» foram e são constituídas por uma argamassa praticamente indestrutível, que é a dos afectos. Ao olhar para os que estão aqui comigo hoje, que me fazem recordar e continuar a aguardar tanta coisa boa, concluo que devo ser um tipo com sorte. Hoje, faço 50 anos. A melhor prenda que recebi foi a vossa presença, que me honrou e tocou profundamente. Estou-vos grato e reconhecido. Podem bater palmas.».
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