31 janeiro 2012

Seca

Com o acentuar da seca, talvez seja útil começarmos a ensaiar a dança da chuva. Pode ser que ajude e poupa-se no ginásio.

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29 janeiro 2012

Chapéus há muitos...

Como todo o aluno cábula, acreditava que a fase «Vasquinho da Anatomia» teria o seu «Momento Mastóideo»!
(reflexão em homenagem a Vasco Santana, «o Vasquinho da Anatomia», em A Canção de Lisboa)

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24 janeiro 2012

É para uma boa causa

Viu-se ao espelho. Achou-se com um ar cansado e ligeiramente baço. Com os dedos, esticou levemente a pele por baixo dos olhos e procurou disfarçar as olheiras. Era inútil: estava velho e sabia-o.
Voltou a olhar-se no espelho e procurou um vislumbre de como era quando jovem. Apertou ligeiramente o nariz. Era um gesto costumeiro, aquele de apertar ligeiramente o nariz, o que revelava alguma preocupação. Olhou de viés, à procura de encontrar um perfil esquecido. Nada parecia resultar. Resignou-se.
Acendeu um cigarro e lançou duas baforadas para o espelho, como se expelisse de si algo de pesado e procurasse no vidro uma resposta.
Maria - chamou - traz-me a carteira!
Contou duas moedas, uma a seguir a outra, de igual valor, e pediu-lhe:
- É para o Presidente Aníbal. É para uma boa causa, pois está a precisar.
Fechou a porta e voltou a olhar para si, reflectido no espelho, de cigarro aceso. Parecia rejuvenescido.

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19 janeiro 2012

Frase

«A vida é um sacrifício para o zangão, mas luminosa para o pardal-cantor».
 (autor desconhecido)

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13 janeiro 2012

Ameaça vs desejo - prognósticos só no fim

«Ou Lisboa toma juízo ou temos de ir para a independência, diz dirigente do PSD-Madeira» (Público, 13 de Janeiro de 2012)...
...E nós aqui no Continente: Força! Força! Força!...
... E concretizando-se a ameaça, de novo no Continente: Aleluia! Aleluia! Aleluia!...

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10 janeiro 2012

Ler com o nariz

Uma imagem lhe saltou logo, incontrolada e caricata, como se verá, quando se apercebe da forma como a senhora lia as folhas. Arrependido, solicita imediatamente a indulgência divina e exclama mentalmente: Deus me perdoe! E repete de novo e repetirá, pelo menos enquanto se lembrar do episódio: Deus me perdoe!
A cena passa-se num transporte público, não interessa se rodoviário, fluvial ou ferroviário, seguramente não aéreo. Como protagonistas, um arremedo de escriba, também fazendo papel de actor, e uma senhora sentada, com óculos, não muito avançada de idade, ainda longe da terceira, mas já pertencente à do meio, por mérito próprio e anos contados. O escrevinhador está de pé, não tem óculos, e posiciona-se no jeito e na perspectiva de uma visão de enquadramento, que se repete quotidianamente, a maioria das vezes sem proveito ou resultado que se veja ou, sequer, se possa vislumbrar. O dia de hoje fugirá a esta contabilidade, está visto, acreditando o escriba que isto se deva a auspícios de novo ano, talvez ocidental, muito provavelmente chinês, como todas as bússolas e astrais parece que apontam.
A nossa senhora, protagonista desta peça, lê com empenho e velocidade, iludindo o esforço e a dificuldade para o fazer. Só não consegue iludir a imagem e a impressão, captadas pelo escrevinhador, responsáveis pelo que se segue e que motivam o arrependimento deste, como se disse já e se verbalizou também, ainda que mentalmente, e se deu a conhecer a outros, registando-o por escrito.
Mas eram as danadas da imagem e da impressão que percutiam na mente do escriba, misturando-se e provocando sentimentos contraditórios, com parte burlesca e metade pesarosa. Mais uma vez, que Deus lhe perdoe!
Na sua diligência na leitura, talvez já hábito e persistência para que nada lhe possa escapar, a senhora dos óculos parecia acompanhar a leitura com o nariz, tal a proximidade do rosto ao papel, tocando-se até, aqui se percebendo que é da impressão e da imagem do cronista que se fala, pois para a maioria das pessoas, leitores ou não deste registo, o cânone da leitura das letras aconchegadas em palavras, passadas em papel de livro ou de cartilhas de abecedário, há muito que está estabelecido pelo uso e o correr do dedo, indicador de seu nome e ambidextro, pois outro que fosse poderia ser entendido como não-apropriado, quiçá não-educado. E este era o cânone conhecido de todos, o que incluía o escriba e a senhora de óculos, por mais distante que a sua prática estivesse do ritual da aprendizagem e da reverência do ler, mesmo que não praticado por todos mas por todos de certa ciência ansiado.
Continua pois a senhora a sua leitura, sabemos nós que agora lemos, mesmo que a tenha pausado na paragem ou no final da sua rota. Do escriba, também conhecido por escrevinhador mas não o conhecendo nós, só poderemos ansiar, certos do número e da autenticidade dos apelos, que Deus lhe perdoe...



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09 janeiro 2012

O acaso

A introdução do comando alterou a forma como se vê e desfruta a televisão. Na maioria das vezes, se não sempre, a disponibilidade, física e mental, e a posse de um comando constituem o meio mais eficaz para a concretização de uma jornada de televisão, mais ou menos prolongada. E foi graças a esta disponibilidade e à posse de um comando de televisão que, meramente por acaso, com as surpresas que só acaso permite, revi Space Cowboys, de Clint Eastwood, na TV.
O acaso tem a singular virtude de nos descobrir como melhor somos ou estamos, isto é, bem nuns dias, melhores ou piores noutros, susceptíveis ou indiferentes, mais dados a devaneios ou taciturnos.
Procuro uma definição para ‘acaso’ e descubro esta: «ocasião imprevista que produz um facto». Se retalhar a frase nos termos que a constituem, obtenho: ‘ocasião’, ‘imprevista’, ‘que’, ‘produz’, ‘um’ e ‘facto’. Posso continuar esta espécie de dissecação e obter, para cada um deles, uma listagem de significados, mais extensa ou mais limitada, que por sua vez poderá dar início a novos processos de procura de significados, sempre mais e mais, até me fartar ou alguém me chamar a atenção para o resultado, que desconheço qual seja. Admito que este exercício possa ser visto como uma excentricidade, mas também quero acreditar que ele sirva, genuinamente, objectivos relacionados com a aquisição e ou o aprofundamento de conhecimentos...
Mas regressemos ao pequeno ecrã.
Não sendo a primeira vez que via o filme, constato, surpreendido e talvez por acaso, que Space Cowboys é uma verdadeira paródia a uma certa forma e tipo de filmes, como se a intenção de Eastwood fosse a de, simplesmente, se divertir à grande, ele e os seus co-protagonistas, todos eles de respeito e já entrados na idade, como se quisessem afirmar, sem complexos, que estão velhos, sim senhor, mas ainda para as curvas, com muito riso e paródia pelo meio, até para protagonizar filmes e contar uma história. E isto, concluo eu, não deve ser por acaso...

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07 janeiro 2012

Palavrário (letra e)

Eleitos encontram eleitores. Encena-se: entoam-se elegias; esgrimem-se estudos; esconjuram-se estilos.
Eleitores elegem eleitos. Expecta-se.
Esmorece entusiasmo. Embirra-se.
Esquecem-se enlevos.
Exige-se...
Eleições.

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A Pérola

O prazer da leitura também está associado à descoberta, própria ou sugerida por outrem. Foi o que aconteceu hoje com a leitura de um livro de John Steinbeck, intitulado A Pérola. Uma escrita cristalina e uma história absorvente, com um toque de magia e de sobrenatural. Um livro que se encaixa e justifica no seu título: uma pérola!

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04 janeiro 2012

A Toupeira

A Toupeira, filme baseado num livro de John le Carré, é uma história fascinante, passada num tempo e numa época míticos – os da Guerra Fria – e contada pelos olhos e pelas memórias de alguns dos seus protagonistas – os espiões.
Como em toda a trama de espiões, a história de A Toupeira centra-se na reflexão em torno do conceito e do valor da lealdade, matéria-prima que enforma o ser e o estar do espião, pré ou pós Guerra Fria.
Sendo a espionagem, por definição, um universo inacessível aos não-iniciados, constituindo um mundo de sombras e um palco para protagonistas sem rosto, durante a Guerra Fria ter-se-á acentuado essa dimensão de secretismo e de exclusividade, quase nos fazendo esquecer que esse mundo, o da espionagem, e esses protagonistas, os espiões, são, para o bem e para o mal, um mundo humano, demasiado humano, e só protagonizado por humanos, de carne e osso, mesmo que formatados de ideologia.
Por isso, em A Toupeira, onde outros filmes nos revelam o glamour e a espectacularidade desse mundo ou desses protagonistas, encontramos como protagonistas cidadãos (quase) anónimos, com os seus sonhos ou decepções, num misto de exaltação ou de resignação pelas suas vidas, pelas suas vitórias ou derrotas, grandes ou pequenas, num quotidiano pintado em cores baças, propositada ou inadvertidamente combinadas.
 E é talvez por isso que A Toupeira é um filme surpreendente, por essa capacidade de assumir a contenção em vez da espectacularidade; por mostrar a complexidade na (aparente) simplicidade; por transformar o normal e o quotidiano no extraordinário e invulgar; numa mescla de sentimentos e atitudes contraditórios, se bem que perenes, ou não estivéssemos a falar de homens e de mulheres comuns, ainda que espiões.

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