Ler com o nariz
Uma imagem lhe saltou logo, incontrolada e caricata, como se verá, quando se apercebe da forma como a senhora lia as folhas. Arrependido, solicita imediatamente a indulgência divina e exclama mentalmente: Deus me perdoe! E repete de novo e repetirá, pelo menos enquanto se lembrar do episódio: Deus me perdoe!
A cena passa-se num transporte público, não interessa se rodoviário, fluvial ou ferroviário, seguramente não aéreo. Como protagonistas, um arremedo de escriba, também fazendo papel de actor, e uma senhora sentada, com óculos, não muito avançada de idade, ainda longe da terceira, mas já pertencente à do meio, por mérito próprio e anos contados. O escrevinhador está de pé, não tem óculos, e posiciona-se no jeito e na perspectiva de uma visão de enquadramento, que se repete quotidianamente, a maioria das vezes sem proveito ou resultado que se veja ou, sequer, se possa vislumbrar. O dia de hoje fugirá a esta contabilidade, está visto, acreditando o escriba que isto se deva a auspícios de novo ano, talvez ocidental, muito provavelmente chinês, como todas as bússolas e astrais parece que apontam.
A nossa senhora, protagonista desta peça, lê com empenho e velocidade, iludindo o esforço e a dificuldade para o fazer. Só não consegue iludir a imagem e a impressão, captadas pelo escrevinhador, responsáveis pelo que se segue e que motivam o arrependimento deste, como se disse já e se verbalizou também, ainda que mentalmente, e se deu a conhecer a outros, registando-o por escrito.
Mas eram as danadas da imagem e da impressão que percutiam na mente do escriba, misturando-se e provocando sentimentos contraditórios, com parte burlesca e metade pesarosa. Mais uma vez, que Deus lhe perdoe!
Na sua diligência na leitura, talvez já hábito e persistência para que nada lhe possa escapar, a senhora dos óculos parecia acompanhar a leitura com o nariz, tal a proximidade do rosto ao papel, tocando-se até, aqui se percebendo que é da impressão e da imagem do cronista que se fala, pois para a maioria das pessoas, leitores ou não deste registo, o cânone da leitura das letras aconchegadas em palavras, passadas em papel de livro ou de cartilhas de abecedário, há muito que está estabelecido pelo uso e o correr do dedo, indicador de seu nome e ambidextro, pois outro que fosse poderia ser entendido como não-apropriado, quiçá não-educado. E este era o cânone conhecido de todos, o que incluía o escriba e a senhora de óculos, por mais distante que a sua prática estivesse do ritual da aprendizagem e da reverência do ler, mesmo que não praticado por todos mas por todos de certa ciência ansiado.
Continua pois a senhora a sua leitura, sabemos nós que agora lemos, mesmo que a tenha pausado na paragem ou no final da sua rota. Do escriba, também conhecido por escrevinhador mas não o conhecendo nós, só poderemos ansiar, certos do número e da autenticidade dos apelos, que Deus lhe perdoe...
A cena passa-se num transporte público, não interessa se rodoviário, fluvial ou ferroviário, seguramente não aéreo. Como protagonistas, um arremedo de escriba, também fazendo papel de actor, e uma senhora sentada, com óculos, não muito avançada de idade, ainda longe da terceira, mas já pertencente à do meio, por mérito próprio e anos contados. O escrevinhador está de pé, não tem óculos, e posiciona-se no jeito e na perspectiva de uma visão de enquadramento, que se repete quotidianamente, a maioria das vezes sem proveito ou resultado que se veja ou, sequer, se possa vislumbrar. O dia de hoje fugirá a esta contabilidade, está visto, acreditando o escriba que isto se deva a auspícios de novo ano, talvez ocidental, muito provavelmente chinês, como todas as bússolas e astrais parece que apontam.
A nossa senhora, protagonista desta peça, lê com empenho e velocidade, iludindo o esforço e a dificuldade para o fazer. Só não consegue iludir a imagem e a impressão, captadas pelo escrevinhador, responsáveis pelo que se segue e que motivam o arrependimento deste, como se disse já e se verbalizou também, ainda que mentalmente, e se deu a conhecer a outros, registando-o por escrito.
Mas eram as danadas da imagem e da impressão que percutiam na mente do escriba, misturando-se e provocando sentimentos contraditórios, com parte burlesca e metade pesarosa. Mais uma vez, que Deus lhe perdoe!
Na sua diligência na leitura, talvez já hábito e persistência para que nada lhe possa escapar, a senhora dos óculos parecia acompanhar a leitura com o nariz, tal a proximidade do rosto ao papel, tocando-se até, aqui se percebendo que é da impressão e da imagem do cronista que se fala, pois para a maioria das pessoas, leitores ou não deste registo, o cânone da leitura das letras aconchegadas em palavras, passadas em papel de livro ou de cartilhas de abecedário, há muito que está estabelecido pelo uso e o correr do dedo, indicador de seu nome e ambidextro, pois outro que fosse poderia ser entendido como não-apropriado, quiçá não-educado. E este era o cânone conhecido de todos, o que incluía o escriba e a senhora de óculos, por mais distante que a sua prática estivesse do ritual da aprendizagem e da reverência do ler, mesmo que não praticado por todos mas por todos de certa ciência ansiado.
Continua pois a senhora a sua leitura, sabemos nós que agora lemos, mesmo que a tenha pausado na paragem ou no final da sua rota. Do escriba, também conhecido por escrevinhador mas não o conhecendo nós, só poderemos ansiar, certos do número e da autenticidade dos apelos, que Deus lhe perdoe...
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