06 abril 2025

Globalização (on the street)

Três pessoas, um homem e duas mulheres, aguardam, no passeio, que o sinal de passagem segura para peões caia. O homem é daquelas bandas e as outras, duas mulheres, apontam para estrangeiras. Na demora da queda do verde para peões, o homem olha para a estrada e, após avaliar o fluxo de trânsito, ainda distante, avança, com folga, logo seguido pelas duas mulheres, ouvindo-se a uma delas, como incentivo para a outra: «Move your butt!», seguido de um «Bom dia!», respondendo, com uma gargalhada, ao sorriso do homem após ter ouvido a frase inicial...


 


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21 junho 2024

Flash na passadeira

Na rua, atravessando a passadeira, uma mulher avança sem esperar pelo sinal... Em andamento, aproveitando ainda o sinal aberto, dois carros, colados um ao outro, esticam o tempo até ao limite, cruzando-se a meio da passadeira com a transeunte, que se assusta, obviamente, mas também se compromete, pela ousadia do que tentara, provocando uma paragem de emergência, com a consoante apitadela, dirigida ao peão, por um lado, mas simultaneamente mimoseando o condutor concorrente, que à cautela cheirara o travão... No passeio, o escriba com o flash da cena... Mas sem assobios, apenas a preocupação...

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18 junho 2024

Gincana

Aproximou-se do passeio e ficou estarrecido ao ver a profusão de caixotes de recolha de lixo... Ganhando alento, iniciou uma gincana arrojada entre eles, obtendo uma excelente média. Entrevistado pela comunicação social, garantiu que estava bem e feliz, apesar de exausto, deixando como recomendação a existência de comissários de passeio, infelizmente ausentes...

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24 abril 2024

Cenas da vida urbana...

O som parecia o de uma motoreta a acelerar, quem sabe a preparar-se para uma qualquer competição...  Parando de vez em quando, ficava-se na dúvida sobre se era de propósito, tipo pausa, ou para fazer alguma afinação. Cansado de esperar e ou deslindar o mistério, chegou à janela e espreitou: na rua, confirmou um artista, de jardineiras vestidas, com um volume às costas, e um tubo nas mãos onde, na ponta, girava uma ventoinha e se cortavam ervas daninhas, ou supostamente assim encaradas, razão do barulho, tipo motoreta, que se ouvia pelas janelas e varandas do edifício. Alertado para a hora, o cortador assobiou para o lado e respondeu que eram ordens, da câmara, mais propriamente, e que a competição só se fosse com o parceiro do passeio ao lado, que se esforçava por dar puxadas no baraço do motor da ferramenta, mas sem sucesso. Até lá, os melros sorriam e esperavam pela sua hora...

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28 dezembro 2023

Passeata

Aproveitando a paragem antes da partida e as portas abertas, o pombo entrou na carruagem do metro e começou a deslocar-se pela carruagem, umas vezes pelo corredor, outras por debaixo dos bancos. Pela surpresa, os poucos passageiros viam e sorriam, alguns, todos expectantes sobre o que se iria passar quando as portas fechassem e o pombo ainda se mantivesse por lá, caso ficasse. Fechadas as portas e iniciado o movimento do comboio, o pombo continuava o seu passeio, sereno, aparentemente, naquele jeito de ir movimentando o pescoço, quem sabe se à procura de alguma coisita para comer, migalha ou semelhante. Chegado à estação seguinte, abriram-se as portas e os passageiros ficaram na expectativa sobre o que sucederia. Mantendo o passo e a cadência, o pombo aproximou-se da porta e, com um pequenino salto, saiu para o cais. Apetecia bater palmas, como num filme ou no fim de um espectáculo, mas não se verificou. No cais, seguindo o seu caminho, o pombo dirigiu-se às barreiras e, abrindo as asas, voou e passou por cima, mas mostrando o passe...


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19 dezembro 2023

Apanhado(s)

«Um dia vai deixar de conduzir. É a vida...», sentenciou a mulher para o homem, que concordou com a cabeça. Sim, provavelmente verdade, concluiremos nós, mesmo não sabendo quem são e a quem se refeririam... E sim, também isso é a vida...

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17 junho 2023

Trepidadela

Já não era a primeira vez que se cruzava na rua com a senhora e o cenário repetia-se: ela a passear com duas cadelas, raça Pequinês ou aparentada, parecia, uma a andar no chão, pela trela, e a outra ao colo, debaixo do braço... Constituindo uma cena repetida e sempre com as mesmas protagonistas, não havia maneira de se passar sem dar conta do episódio, a maioria das vezes sinalizado com sorrisos de parte a parte, sob a capa de uns bons-dias, pois a cena ocorria, invariavelmente, no período da manhã. Até esse dia, em que do sorriso se passou para um comentário sobre a situação, perguntando pela eventual fadiga da cadela debaixo do braço, para não dizer mimo ou susceptibilidade do bicho, parecia-lhe a ele. Mas estava enganado, reconheceu logo a seguir, pois a senhora respondeu em Inglês à pergunta, dizendo e apontando como causa para o comportamento da cadela como situação recorrente desde cachorra, suspeitando a senhora que se devia a medo/fobia das vibrações da calçada, tendo-se presente que se tratava de uma rua movimentada e com muito tráfego rodoviário...

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23 abril 2023

(Ins)tacionar

Naquele dia, na avenida, com pouco movimento, era mais fácil visualizar factos que, noutro dia, podem passar despercebidos ou alheados da azáfama dos passeantes... À primeira vista, nada de estranho, aparentemente, na posição de um condutor de um carro, conveniente e devidamente estacionado, com a porta aberta, e onde, pacatamente, se está encostado de frente, mas com algum espaço da porta. Só com a aproximação, porém, é que se começa a desmontar a imagem e o cenário aparentemente anódinos de um condutor de fora da sua viatura estacionada, com o braço pousado na porta: o som familiar de alguém que se alivia com um xi-xi para a calçada!... Perscrutado o horizonte e as imediações em busca de uma placa ou sinal indicativo de «mijada autorizada», obviamente inexistente, restou o encolher de ombros do passeante, assim como que resignado, saindo-lhe um comentário, sob a forma de aforismo caseiro: «se lhe apetecer verter águas, estacione primeiro».

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01 outubro 2022

Na linha de fogo...

Agora, que tudo se passou, é fácil fazer vaticínios ou especular sobre os indícios... Estava calor e a hora não seria a mais apropriada para o balancete de possibilidades... Mesmo assim, seguiu em frente. E tão bem ou mal o fez que, passado o desconforto, no início se irritou e, no fim, acabou às gargalhadas... Pensando bem, quem o tinha mandado colocar debaixo da linha de fogo do pombo no beiral...?

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01 agosto 2021

Em jeito de desfile...

A idosa deslocava-se com dificuldade, mas ainda pelo próprio pé. Todos os dias, ou quase todos, cumpria uma espécie de ritual: dar de comer a gatos, uns à frente e outros na traseira do prédio, de manhã e à tarde, sem desfalecimento, com uma ou outra recriminação, à laia de zeladora do bem-estar da gataria, uns mais do que outros, note-se, mas aos eleitos proporcionando aquilo que de melhor lhes poderia proporcionar a estadia numa espécie de «paraíso» - comida, acolhimento e liberdade... Para os outros, os não-eleitos ou encarados como invasores (quem os poderia censurar...!?), uma cartilha diferente, feita de ameaças e de «castigos» à base de voz alteada e de «penas» inimagináveis para os prevaricadores, que se pusessem a pau, ai deles!... E a cena repetia-se, dia após dia...

Como se repetia também um outro cerimonial, à laia de espectáculo para conhecedores e passeantes de ocasião, ao longo da rua por onde a velhota se movimentava, devagar, devagarinho, mas sempre andando em frente, à direcção que lhe servia de destino, e acompanhada pelo seu fiel escudeiro, um gato, pois claro, que a acompanhava, como um cão, doseando o passo e a cadência pelos do da senhora, como num desfile, «Vejam, senhoras, senhores, só visto! Só visto!», com direito a reprise e percurso inverso, nunca se vira uma coisa assim!...


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25 dezembro 2020

Um passo a seguir ao outro

Passear cedo pela cidade sem a presença de muitos dos sinais da sua habitual e fervilhante actividade, como acontece aos fins-de-semana ou nos dias a seguir a grandes festividades, como o Natal ou o Ano Novo, por exemplo, tem os seus encantos ou as suas vantagens, mesmo que singelos ou pueris. Entre eles, o da atenção às pequenas coisas ou aos pequenos episódios, como estes:

Do velhote que atentamente cata a calçada com as mãos junto de um quiosque e de lá recolhe pequenos bombons perdidos, talvez por causa de um imperceptível rombo num saquinho que os albergava, embrulhados no seu papel brilhante, e que fará as delícias  de quem os descobriu e recolheu...

Da descoberta de um trocadilho em volta da letra 'F', daqueles que ruborizam ou fazem sorrir, apenas, manuscrito artesanalmente num papel na porta de uma loja a viver dias difíceis, quiçá irrecuperáveis...

Do sinal de esperança que se detecta na exclamação que se ouve, assinalando a possibilidade de descoberta de um café aberto, pequenino na única mesa à mostra, preciosidade entre as preciosidades mais preciosas do dia...

Da criança pequena, muito pequena, ensaiando pequeninos e titubeantes passos agarrada à mão do pai e sonhando com o dia, distante ainda, em que ela própria, quem sabe...?, dará a mão a uma outra, pequenina como agora ela...

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18 janeiro 2015

O ovo

Começou a cair chuva, compassada a granizo. Preparada para aguaceiro sem projécteis, rapidamente a fila para o autocarro se reorganizou por causa do granizar, acolhendo-se ao resguardo da paragem. Não sendo muitas as pessoas, havia alguma folga. Talvez por ela, não lhe passou despercebida uma daquelas singularidades que, em simultâneo, provocam a surpresa e o riso, ainda que discretos: uma bolinha de granizo acabada de depositar no cimo da cabeça de um aspirante a estrela de clube de futebol, quase de certeza, atendendo ao corte de cabelo, rapado dos lados e deixando crescer, no alto da cabeça, uma porção de cabelo em forma de alcatifa ou, se preferirem, com a aparência de um ninho. Para reforço da imagem e comprovando a sua pertinência,  poder-se-ia dizer que, pelo menos até que derretesse, aquele «ninho» continha um «ovo»...



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30 junho 2012

Jacarandás (II)

A exuberância dos jacarandás foi-se, quase de repente. Felizmente que o seu período de exuberância durou mais, dando espectáculo para quem quis segui-lo. Quem não viu... Para o ano, há mais.

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17 junho 2012

Jacarandás

Juntar a copa dos jacarandás com a copa de outras árvores, como acontece em várias zonas de Lisboa, proporciona um efeito cromático e visual espectacular, em que sobressai aquela espécie de tufos de algodão violeta dos jacarandás, destacando-se de tudo o resto. Belíssimo!

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04 setembro 2011

Prenúncios

Os prenúncios do fim do Verão e da proximidade do Outono, por mais matizadas que estas diferenças estejam, hoje em dia, transformam-se num sinal para a interiorização e o recolhimento. Processo necessário, nem sempre se lhe dá o devido valor, obscurecido por luminosidades (supostamente) mais apetecíveis. Tudo a propósito de uma caminhada matinal, inalando o aroma da terra molhada e a aproveitar o remanso da manhã de domingo.

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20 novembro 2007

Chuva

Chegou a chuva e, parece-me, já se vai embora. Enquanto cá esteve, fez vir ao de cima o que é habitual: lixo, lixo, lixo, caos no trânsito, buracos, buraquinhos e buracões e uma genérica evidência
de coisas mal feitas, atamancadas, presas por arames ou cordas rascas, num perpétuo ciclo de amadorismo, irresponsabilidade e de espírito do «pontapé p' frente e fé em Deus».

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28 outubro 2007

Animais

Há alguns dias que era sempre a mesma coisa. Ao passar pelo local, sempre o mesmo, estranhava o miar invulgar do gato: rouco e rogativo. No primeiro dia notou, mas não ligou. Ao segundo, porém, estranhou: já não era uma coincidência. Pelo canto do olho apercebeu-se de uma forma rectangular que esvoaçava, presa de um fio, vinda de cima e em direcção ao chão, qual elevador tosco e infantil. Assomando à janela, um velhote dava resposta ao «rogo» do seu amigo e protegido, o gato, talvez sem dono - quem sabe?... Estava descoberto o mistério, um belo exemplo de cumplicidade e gratidão na grande cidade. De um lado, um velho. De outro, um gato com fome. É a grande cidade que os une.

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