25 novembro 2011

Nos Idos de Março

Quero crer que será mais do que isto, mas olhemos para a política como uma «tentação», como um «apetite ou desejo violento», fundamento suficiente para ajudar a justificar comportamentos não plausíveis ou a defesa de princípios criticáveis, procurando, com este artifício de interpretação, lidar com o desconforto, consequência do pudor ou da ingenuidade, com aquilo que se propõe ou subentende no filme de George Clooney, Nos Idos de Março, apesar do fascínio do espectador pelo que vê desenrolar-se à sua frente, como num thriller, justificando-se plenamente um olhar atento sobre a sua história, mesmo que se seja compelido, como é o meu caso, a sossegar a consciência na almofada de que a realidade de que nos falam é, por maioria de razão, só pensável e enquadrável no contexto político e institucional dos Estados Unidos da América (EUA). Se é só aí, nos EUA, ou também  noutros sítios, é coisa que nos pode levar longe, muito longe, em todo caso não sendo tranquilizadora essa perspectiva, pelo que encerra e potencia, atendendo aos contornos do filme.
Nos Idos de Março, apesar de centrado num contexto específico, perspectiva-se como um ensaio sobre a política, o poder e os seus protagonistas, muitos deles na sombra, nem por isso menos poderosos ou temíveis, ou se calhar por essa mesma característica, a da permanência na sombra, embora muitas vezes tentados pela atracção do palco e das luzes, como parece depreender-se do filme, num permanente e complexo jogo de xadrez, com lances ousados ou hesitantes, eficazes nas vitórias e confrangedores nas derrotas. O universo da política que o filme nos mostra é o de um jogo duro e implacável, pouco ou nada dado a contemplações ou desfalecimentos, selvagem, mesmo, ainda que sob uma capa de urbanidade e deferência cínicas. Trata-se de ficção ou, pensamos nós, retrata uma realidade específica, por mais incómoda que se nos afigure?...
Há muitas e variadas razões para ver Nos Idos de Março, um curioso título que ilustra todo um mundo, como fiquei a saber, ainda que desagradável. Para se lhe juntar, e talvez complementarmente, vou tentar recordar-me da cena inicial, também ela todo um programa de intenções, só plenamente desveladas no final do filme. Mas que nós não sabemos.

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