A fuga da boca
A Boca fugira-lhe para
a Verdade. Não se tratava de uma mera fuga de casa, com retorna passado pouco
tempo. Não, a fuga para a verdade era algo mais complexo. Havia que explicar
porquê.
Que a Boca andava
insatisfeita era voz corrente. Várias tinham sido as vezes em que se queixara e
ameaçara com medidas drásticas. Que iam sendo proteladas... Continuava-se a não lhe
dar ouvidos, atribuindo-se esse desejo à idade ou a distúrbios hormonais. Mas o
problema subsistia...
E acabou por se
precipitar. O momento determinante foi numa sexta-feira, ao cair da tarde. A Boca estava a preparar o jantar e bateram à porta. Quando a abriu, o sorriso
rasgado da Verdade insinuou-se-lhe e transpôs a porta, entrando para a sala. O
baque na Boca foi tremendo, sabendo-se agora que foi fatal. Depois da conversa,
que se prolongou algum tempo, um convite para uma saída, para beber um copo.
A Boca ficou a pensar
sobre a conversa que tinha tido com a Verdade. Ela tinha razão, não em tudo. Na
maioria tinha. E era descarada, notando-se que ali havia muito mundo... Com
sentido de humor também, às vezes negro, noutras inconveniente.
Não demorou muito a
aceitar o convite para a saída.
Tinha sido uma noite
agradável. A Boca e a Verdade pareciam almas gémeas, próximas que eram. Planos
para o futuro alguns, a começar já. E a fuga ocorreu.
A fama da Verdade era
conhecida. Por boas ou más razões, havia sempre mais um acrescento. Que era
dura, se sobrepunha a tudo, descarada, volúvel por opção e capricho. Fosse pelo
que fosse, o certo é que fascinou a Boca... Que foi atrás dela e por lá ficou.
Mesmo sem dentes.
Etiquetas: Historieta
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