As vozes
Pensar ou falar em voz alta é uma experiência relativamente comum, utilizada até para estudar. Estabelecer um diálogo em voz alta já não é tão comum, mas acontece. Há sítios mas apropriados para este espaço de diálogo, mas a rua não devia ser um deles, embora os problemas de espaço, sobretudo nas zonas urbanas, e a ausência de uma sala própria acabem por transformar a rua num sítio onde isso pode vir a ocorrer com frequência, com os inerentes riscos, como são o da possibilidade de vir a ser atropelado, chocar com um candeeiro (se os houver), ir de encontro a uma montra (se o espaço for comercial), ou alguém questionar legitimamente o estado mental de quem está a promover «a conversa». Mesmo assim, há quem não abdique de uma troca de impressões com as vozes
que gravitam na sua órbita, umas convidadas e outras por convidar, mas
que aparecem na mesma, às vezes as mais interessantes, porque costumam
ter outra experiência ou ponto de vista, coisa de atender quando o fórum
se quer como de abertura e de exercício democrático.
Se estas manifestações verbais às vezes causam algum embaraço, sobretudo se elas ocorrem em locais ou em momentos pouco adequados a ser-se confrontado com um fórum de conversa, como são os casos de andar pela rua, preparar-se para cortar o cabelo ou fazer umas compras, por exemplo, há quem procure resolver o embaraço recorrendo a um velho truque, aprendido com o pessoal do teatro, e que consiste em falar para o bolso da camisa ou do casaco, apontando com o dedo para o bolso e dando a entender que se é um intelectual a gravar comentários ou ideias para o futuro, encontrando-se o gravador no dito bolso. Há quem compreenda e diga que sim, que já fizera o mesmo, mas que agora estavam um pouco afastados disso, talvez noutro dia. Para os que não compreendem, talvez a maioria, há os que perguntam se o gravador também dá música e qual é que é, disponibilizando-se para arranjar uns hits que podem ser ouvidos mesmo sem o gravador, mas que terá que que ser mais tarde, pois agora não estavam com muito tempo...
Apesar de habituado a ter diálogos com interlocutores imaginários, sem nome mas com voz, a frase, «Acha que é arriscado?», saiu-lhe como pergunta, lançada à laia de mote, e era suposto ter sido feita numa frequência sonora só audível por quem participava na conferência desse dia, por acaso a decorrer no cruzamento da rua de baixo com a rua de cima, muito próximo do cruzamento da rua esquerda com a rua direita, mas a que uma conjugação de factos, do domínio da Física, tinha revestido de uma sonoridade e de um simbolismo invulgar, levando a senhora, com quem se cruzara, a mudar de repente do passeio, curiosamente a comentar, ela também, num sonoro e audível «Já viu?», e dirigida a um destinatário ou destinatários não visíveis...
Se estas manifestações verbais às vezes causam algum embaraço, sobretudo se elas ocorrem em locais ou em momentos pouco adequados a ser-se confrontado com um fórum de conversa, como são os casos de andar pela rua, preparar-se para cortar o cabelo ou fazer umas compras, por exemplo, há quem procure resolver o embaraço recorrendo a um velho truque, aprendido com o pessoal do teatro, e que consiste em falar para o bolso da camisa ou do casaco, apontando com o dedo para o bolso e dando a entender que se é um intelectual a gravar comentários ou ideias para o futuro, encontrando-se o gravador no dito bolso. Há quem compreenda e diga que sim, que já fizera o mesmo, mas que agora estavam um pouco afastados disso, talvez noutro dia. Para os que não compreendem, talvez a maioria, há os que perguntam se o gravador também dá música e qual é que é, disponibilizando-se para arranjar uns hits que podem ser ouvidos mesmo sem o gravador, mas que terá que que ser mais tarde, pois agora não estavam com muito tempo...
Apesar de habituado a ter diálogos com interlocutores imaginários, sem nome mas com voz, a frase, «Acha que é arriscado?», saiu-lhe como pergunta, lançada à laia de mote, e era suposto ter sido feita numa frequência sonora só audível por quem participava na conferência desse dia, por acaso a decorrer no cruzamento da rua de baixo com a rua de cima, muito próximo do cruzamento da rua esquerda com a rua direita, mas a que uma conjugação de factos, do domínio da Física, tinha revestido de uma sonoridade e de um simbolismo invulgar, levando a senhora, com quem se cruzara, a mudar de repente do passeio, curiosamente a comentar, ela também, num sonoro e audível «Já viu?», e dirigida a um destinatário ou destinatários não visíveis...
Etiquetas: Historieta
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