27 setembro 2006

A Comissão

A "Comissão de Revisão do Sistema de Carreiras e Remunerações" (CRSCR) cessou funções, por decisão do Secretário de Estado da Administração Pública, após a apresentação do seu relatório. Não é muito vulgar que a cessação de funções de uma comissão nomeada pelo Governo tenha direito a comunicado de imprensa próprio. Por qualquer razão, esta teve. Não deixa de ser um facto curioso, susceptível de várias interpretações, como aquela de que se destinaria a combater um princípio de incêndio que estaria a lavrar nos media... Se foi ou não esta a motivação, mais tarde se verá. Que me pareceu eficaz como instrumento de controlo de estragos, pareceu. Adiante.
Segundo o comunicado, as razões para a cessação de funções da comissão estiveram relacionados com os pedidos de demissão apresentados por alguns dos seus membros, invocando razões de natureza profissional - e para que não restassem dúvidas, são os referidos demissionários nomeados individualmente - não se justificando, segundo o secretário de Estado, proceder à recomposição da CRSCR, com os inerentes atrasos para a urgência da aplicação das medida de política. Está bem, seja.
Ser membro de uma comissão destas é, julgo eu, prestigiante. Por isso elas devem ser apetecidas ou desejadas. Quem, no seu legítimo juízo, desdenharia mostrá-la e ostentá-la na lapela do seu currículo, mesmo que na alínea z) da página 43, capítulo "Outros"? Se calhar, ninguém. A não ser...
Não é de agora, a ideia de pegar em meia dúzia de especialistas entendidos - académicos, de preferência - para fazerem parte de uma comissão destinada a avaliar, propor ou apontar caminhos de reforma para a administração pública (AP). É um caminho - legítimo e justificável, aceito - mas, muitas vezes, com resultados eventualmente não expectáveis. Talvez como neste, atendendo ao número de pedidos de demissão e às razões invocadas. O que é que terá corrido mal ou não foi previsto pelos membros da CRSCR que pediram a demissão? O prolongamento dos trabalhos? Problemas de relacionamento institucional? Outros? Provavelmente, nunca o saberemos.
Quando a CRSCR foi criada, estavam previstas mais tarefas para ela executar: propostas legislativas e acompanhamento do processo até ao final de Dezembro de 2006, para além do relatório que apresentou, inicialmente previsto para Abril deste ano..., como nos recordou Helena Garrido, no DN. Terá alguma coisa a ver? Eu sei que não costuma ser hábito decisões como a que se verificou em relação à CRSCR, havendo quase uma tendência para que as comissões ou estruturas similares prolonguem a sua existência e actividade, até que uma qualquer reforma as vá desencantar do seu canto. Não seria caso inédito. Será que estamos a assistir a uma mudança de paradigma na AP, tendo por objectivo uma responsabilização efectiva pela apresentação de resultados concretos - e nos timings previstos - a estas estruturas, que justifiquem a razão de ser da sua existência?
É verdade que o comunicado de imprensa louva o trabalho da comissão. Mas também é verdade que não se fazem comunicados destes todos os dias, relacionados com a cessação de funções de comissões. Eis um bom tema para reflexão. Provavelmente, um tema bom para constituir uma comissão.

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