O meu nome é...
Não era por falta de alertas que as coisas não se sabiam... Aliás, era uma das minhas principais preocupações quando procurava ensinar aos estreantes as regras básicas do ofício de escrevinhador: o cinema é o cinema e a vida é a vida. Misturar os dois era desaconselhável, por mais tentador que fosse... E era, sem dúvida, como tive oportunidade de o verificar amiúde, seja pelos convites frequentes para que aceitasse participar em filmes, mesmo não sendo protagonista, às vezes só a servir de cenário, mas noutras em que os papéis tinham sido escritos e pensados para mim, disseram-mo várias vezes realizadores com quem tive o privilégio de contactar e conhecer, do Tati ao Allen, sem esquecer o Fellini, grande amigo, que me honrava com a sua amizade e, também, com uma ou outra sugestão sobre um plano, um enquadramento, um guião, uma personagem, a escolha de um vinho apropriado para uma ocasião de festa, fosse um evento, um festival ou uma simples patuscada de presunto, pão e azeitonas... Adelante!
Mas a tentação para misturar os dois mundos era grande, já o disse, e quase inescapável, tinha passado por isso dias atrás, num momento (raro) de poucas preocupações com reportagens, artigos e ou crónicas, em que me tinha dedicado uma pausa e a fruição de um filme de aventuras, dos do James Bond, na televisão do costume, quando tocou o telefone, de forma mais repenicada do que o habitual, o que me obrigou a atender. Era uma fonte. Ainda procurei dissuadi-la, dizendo que estava a ver um filme em que tinha de me concentrar para fazer uma crítica, numa revista da especialidade, se era urgente e se não poderíamos falar noutra altura... Mas, conhecendo-me ela muito bem, perguntou-me se não estaria antes a ver o filme do James Bond que estava a dar na televisão àquela hora, preparado para o ripanço, e a despachá-la com toda a força, mas fazendo mal, pois tinha uma coisa que me interessava, e muito!... E aqui, o meu instinto não perdoava: tinha que ouvir a fonte!
E o que ela me dizia, pensando bem, alertara-me para uma das questões centrais nos filmes do Bond, que era a da enunciação do nome, a mítica «Bond. James Bond!», aplicada como chapa quinze em todos eles, fosse qual fosse o protagonista. E aqui, a coisa fiava (piava...?, era uma dúvida clássica, teria que ver isto num prontuário ou numa gramática, não podia deixar passar) mais fino, nem de propósito, pois me permitia dar sequência a uma dica que me tinha sido sugerida por um duplo, manipulador de profissão, sobre um caso que ele conhecia, de alguém que vivia obcecado com a falta de impacto causado pela enunciação do seu nome quando comparado com a do James Bond, designadamente nas partes relacionadas com o glamour, as moças bonitas, os carros e os cenários de arregalar o olho... Tinha que entrevistar o personagem que o duplo me indicara, que se suspeitava frequentava uma tasca perto de minha casa, e que me podia dar um furo de todo o tamanho! Já estava a caminho...
(continua...)
Etiquetas: Manuscrito
<< Home