01 dezembro 2017

Tarefas do dia

À falta de papel, reviu a lista de tarefas mentalmente. Iria ter um dia intenso, pelo menos da parte da manhã. Recapitulava: passear o cão, dar umas voltas ao quarteirão, compor um ou dois contos, passar os olhos e a paciência pelos problemas do mundo, respirar fundo, fazer um caldo verde. O cozido ficaria para depois, se tivesse ainda tempo. Mas continuava com dúvidas acerca do caldo verde. Se calhar inclinava-se mais para um creme de cenoura, mas seria melhor não se inclinar muito, por causa das quedas. Na dúvida, ficava apenas o cozido. O resto podia manter-se e era melhor apressar-se, por causa do cão, que ameaçava verter-se pelas patas abaixo (e logo em cima da carpete, que era nova), não sendo já suficientes os apelos à quietude e ao sit!, que o bicho não compreendia por (ainda) não saber inglês, mas que lá chegaria, estava certo. Teria que ir, estava visto.
Já na rua, apercebeu-se que o quarteirão estava num rebuliço, com polícia a controlar, e uma equipa de filmagem a ensaiar uma cena das que acabam por se ver nos filmes, mas sem os adereços. Afinal, era isto o cinema! Gostava, é certo, mas as filmagens punham em causa as suas voltas ao quarteirão, que faziam parte da rotina mas não tinham a autorização que o filme dispunha e isso era um problema. Sorte que o cão alçara a perna junto de um dos actores, que fazia de árvore, e abanava os galhos a imitar o vento, isso percebia-se, e até conferia um toque de realismo, a imitar a humidade, pois sem isso não há árvore que se aguente. Esqueceria as voltas e ficar-se ia pelos sprints a acompanhar a deslocação da máquina das filmagens nos carris, que também serviam para o cão dar umas corridas agarrado à trela, e isso não era mau em termos de metodologia de treino. Feitas as contas, saía a ganhar.
Mas o tempo para os contos (um ou dois, comprometera-se), começava a ser curto, à semelhança daquelas camisolas que já não servem nas mangas, porque encolheram ou os utilizadores mingaram, hipótese não desprezível, e cada vez mais actual por causa do tempo, o meteorológico e o outro, qual deles o melhor. Teria que se contentar com um mix, à laia de compensação mas muito actual, contribuindo com isso para o desenvolvimento de conteúdos para as diversas plataformas, quaisquer que elas fossem, mas sempre boas, era uma questão de princípio da qual não abdicava. E com isto concretizava esta parte da lista. Com sorte (muita, mesmo!), ainda receberia uma menção no passeio dos Escritores Fantasma, em inglês Ghost Writhers, e em espanhol Escritores Fantasma, já agora, devemos ter visão global e empresarial, cai sempre bem, e nunca se sabe o que o mundo nos reserva. Apostar na tripla, sempre!
E a imagem da tripla vinha mesmo a calhar, coisas do caraças! Queria-se melhor coisa para lidar com os problemas do mundo? Nem por sombras! Era tripla e era porque não havia mais! Como sopa no mel!
Por uma coincidência feliz, com a sopa no mel fechara-se o círculo. Não como as malhas que o império tece (não era de têxteis que se tratava), mas de um final feliz para uma história atamancada, que também as há, também as há... ainda que se acredite que poucas.
A vantagem desta, que se agradece nos dias como o de hoje, a dar para o frescote, é a de servir de aconchego ao estômago, esse bandulho eternamente insatisfeito, e com um toque gourmet.

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