Águinha com açúcar
A crise existencial bateu-lhe à porta, rota e esfomeada. Também a lamentar-se de que «assim não dava», «não podia ser» e que «tinha sido roubada». Quanto às primeiras queixas não havia novidade, mas o mesmo não se podia dizer da última, pelo menos que se recordasse. Olhou para o relógio e analisou se podia condoer-se com a crise, se teria tempo, pois era uma pessoa muito ocupada e tinha um compromisso daí a pouco... Depois de analisar concluiu que sim, que daria um tempinho para ver o que podia fazer com a crise existencial. Convidou-a a entrar e disse-lhe que não se esquecesse de limpar os pés, pois quem lhe fazia as limpezas só viria daí a dias e os sapatos da crise vinham cheios de porcaria, não sabia se animais se de problemas vários, mas provavelmente alguns não vacinados ou desparasitados... A crise emocionou-se e começou a entoar um canto de hossanas a quem assim a recebia, «tão boa alma e sem preconceitos», que «já não havia pessoas assim», solidárias e preocupadas com o seu semelhante, mesmo que crises. À medida que a ouvia começava a arrepender-se e disse-lho, mais como aviso do que ameaça, incentivando-a a deixar-se dessa conversa, que já não tinha paciência... A crise ouviu-a, arregalou os olhos e começou a balbuciar, chamando pela mãe e pelo pai, «que nunca conhecera», dizia ela, e não tardaria nada começaria a chorar, previu logo, o que de facto aconteceu... As coisas não estavam a começar bem e isso não lhe agradava. Respirou fundo e procurou intimamente dar-se ânimo, caso contrário ainda se «passava dos carretos» e escorraçava a crise aos pontapés e aos berros, teria que controlar-se. Talvez um copinho de água com açúcar resolvesse o problema…
Etiquetas: Historieta
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