19 novembro 2016

Perplexidades


Ouvira-se um grito na rua, não se sabendo a que propósito. Mas tratava-se de um grito, não havia dúvidas, e fora já confirmado pelos tiradores de dúvidas. O passo seguinte era o de procurar indagar-se a que é que se devia, o que é mais fácil para quem esteja na rua e não pode esconder-se, mais difícil para quem está em casa, porque exige esforço. Mas também acontece as posições inverterem-se. Esta foi uma dessas.
Por sorte ainda não se tinha deitado e estava a ver um programa sobre a forma e o conteúdo. Fora mesmo sorte, pois o conteúdo entrara numa polémica com a forma, que começara por ser interessante mas que se arriscava a terminar em pancada, tal era o nível dos argumentos trocados. Contrariando uma tendência comum, a ameaça de pancadaria dava-lhe sono, levando-o a cabecear várias vezes contra o espanta-espíritos, ali colocado estrategicamente para evitar isso mesmo, o cabecear. Mas o grito despertara-o.
Iria ver o que se passava e aproveitava para comprar pastéis de nata, que já deviam estar a sair do forno, e oferecer um ou dois à super-lua, que passara por ali, e continuava a exibir-se, não por gabarolice mas por convicção. Estava na sua e era deixá-la. Daqui a uns anos voltaria a fazer o mesmo, diziam-lhe os astros e os comentadores.
Ficar alerta quando se ouve um grito é, parece, algo que deve estar inscrito no ADN. Lera algures e estava a confirmá-lo agora. Não interessa o motivo, mas o facto em si. Também acontece o mesmo com os foguetes, mas estes têm um calendário mais restrito. Com os gritos a temporada é constante, sem pausas para descanso ou dias de férias. Olhando-os do ponto de vista laboral, os gritos são explorados. É um absurdo, nos tempos que correm.

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