20 dezembro 2010

Dos Homens e dos Deuses

Dois quotidianos convivem e interpenetram-se há anos: o de um mosteiro, o mosteiro de Tibhirine, habitado por monges católicos, na região argelina da cordilheira do Atlas, e a aldeia de muçulmanos que palpita e medra em consonância com e pela presença do mosteiro. É um quotidiano que se rege pela simplicidade, respeito e harmonia, pautado pelo ritmo e o apelo do místico, combinados com o pulsar e a vivência do terreno, com as suas cambiantes de optimismo ou desilusão, amor ou ódio, esperança ou desespero. Até um dia, nos primeiros anos da década de 90 do século passado, em que uma espiral de violência, sectarismo e morte vivida na Argélia introduz a sua faceta caótica num cenário e num quotidianos organizados em torno das noções de partilha e de tolerância, simultaneamente materiais, nos actos, e espirituais, nos propósitos.
Foi com curiosidade, no mínimo, mas também com alguma apreensão, que fui ver o filme «Dos Homens e dos Deuses», realizado por Xavier Beauvois, um filme caracterizado como «uma história de fé, religião, irmandade e espírito de missão» por André Rito, na entrevista com o realizador publicada no ionline em 13 de Outubro deste ano, ou, na transcrição das palavras do realizador nessa entrevista, «entender este filme como uma reflexão sobre resistência. Não como definição, mas como o acto de resistir enquanto forma de sobreviver, de resistir ao medo, de continuar a lutar».
«Dos Homens e dos Deuses» é um filme que procura remar contra a maré das «verdades» e das «evidências» actualmente dominantes, inclusive sobre a forma e maneira de ver e fazer cinema. Talvez por isso - quem sabe?... - o êxito e o reconhecimento que vai granjeando.

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