O meu calo
Não escrevia aqui, desde 10 de Janeiro. Não tinha tempo, não me apetecia, porque estava frio, não me interessava. Também não era por falta de assunto ou motivos de interesse. Neste aspecto, as ocasiões foram muitas e diversificadas: desde a intervenção israelita em Gaza, aos prémios do Cristiano Ronaldo, à tomada de posse do Barack Obama, as (im)previsões económicas, o(s) orçamento(s) suplementares, as obras públicas, o mau tempo, as polémicas à volta da arbitragem, das greves dos professores, até ao Freeport de Alcochete..., enfim, da «crise» permanente e diária, seja sobre a roupagem da «estagnação», da «recessão» ou da «degradação», o que quer que isso seja! Não escrevia, ponto.
Não que esta ausência incomodasse ou fosse notada por alguém, excepto talvez por duas leitoras já idosas, uma dos Nozelos, outra do Alegrete, que teimavam em deixar-me comentários nos meus posts, julgando tratar-se do seu (delas) primo emigrado no Brasil, desde 1920 e uns meses... Para o «primo» do Brasil, também (e caso esteja vivo), um beijinho das primas Delmira e Custódia, que se encontram bem e recomendam, apesar dos achaques característicos da idade, que é bonita, sim senhor: 93 e 87, respectivamente.
Mas, verdadeiramente, a razão que me levou a escrever hoje foi a lembrança de um velho «amigo», há algum tempo desaparecido do meu relacionamento: o meu calo!
O fenómeno e a lembrança, devo dizê-lo, teve o seu quê de «epifania», pois me apareceu de repente e me «iluminou», tal como acontece com o José Saramago, quando cria um novo livro. Também eu, à semelhança de Saramago, imediatamente «vi» o princípio e o fim da minha «revelação»: o título para o post e a frase final. Ao contrário de José Saramago, contudo, a mim a «revelação» aconteceu-me na cama, acabado de acordar, e a ele isso costuma acontecer na rua ou quando olha para as montras... Também por isso, se compreende que ele tenha ganho o prémio Nobel e eu me fique pelas minhas duas únicas e exclusivas leitoras, uma nos Nozelos, outra em Alegrete, e que ainda por cima me confundem com um remoto «primo» no Brasil, provavelmente já defunto e, quem sabe (?!...), a usufruir de uma nova vida ou reencarnação como guia turístico em Bombaim ou jogador de futebol no campeonato do Cazaquistão...
Voltemos, pois, ao meu calo, que isto de digressões, literárias, artísticas ou turísticas é para quem sabe e pode. Fiquemo-nos pelo calo: é mais simples, universal e terra a terra.
Não me recordo se o meu calo era no pé direito ou no pé esquerdo. Ou se era nos dois pés. Se calhar era nos dois.
Seja como for, tinha estima pelo meu calo. Um bocadinho chato, às vezes, mas sempre presente até há algum tempo. Era alguém em quem se podia confiar, apesar das contrariedades: uma dorzita agora, um arranhãozito na perna, um pequeno incómodo no andar, mas sempre pronto e solícito, pois para isso tinha sido feito: chatear e incomodar o seu «dono», nem que fosse só um bocadinho. E ele pagava por isso, coitado. De tempos a tempos, como uma sentença, o meu calo era «decapitado» e deixava-me sossegado, pelo menos durante algum tempo. Mas ele voltava sempre, fiel que era, e eu aceitava-o resignado, como naqueles relacionamentos que já duram há alguns anos e aos quais nos vamos habituando, apesar das resmunguices, birras ou coisas similares.
O meu calo desapareceu para parte incerta, como aqueles amigos que desaparecem por algum tempo, embora sempre presentes. Não me parece que se tenha ido embora de vez, nem muito menos chateado, penso. Se calhar, foi gozar umas férias ou meditar para um retiro. Em todo o caso, meu caro calo, se alguma vez te chateaste comigo acredita que foi sem intenção da minha parte. Se isso aconteceu, peço desculpas. Ou, em linguagem mais cinematográfica ou novelísticas: volta, estás perdoado!
Como escrevi e previ, foi como costuma acontecer com o Saramago: sabia o titulo e a última frase. O recheio?!... Bem, o recheio... Talvez quem tenha um calo possa compreender...
Não que esta ausência incomodasse ou fosse notada por alguém, excepto talvez por duas leitoras já idosas, uma dos Nozelos, outra do Alegrete, que teimavam em deixar-me comentários nos meus posts, julgando tratar-se do seu (delas) primo emigrado no Brasil, desde 1920 e uns meses... Para o «primo» do Brasil, também (e caso esteja vivo), um beijinho das primas Delmira e Custódia, que se encontram bem e recomendam, apesar dos achaques característicos da idade, que é bonita, sim senhor: 93 e 87, respectivamente.
Mas, verdadeiramente, a razão que me levou a escrever hoje foi a lembrança de um velho «amigo», há algum tempo desaparecido do meu relacionamento: o meu calo!
O fenómeno e a lembrança, devo dizê-lo, teve o seu quê de «epifania», pois me apareceu de repente e me «iluminou», tal como acontece com o José Saramago, quando cria um novo livro. Também eu, à semelhança de Saramago, imediatamente «vi» o princípio e o fim da minha «revelação»: o título para o post e a frase final. Ao contrário de José Saramago, contudo, a mim a «revelação» aconteceu-me na cama, acabado de acordar, e a ele isso costuma acontecer na rua ou quando olha para as montras... Também por isso, se compreende que ele tenha ganho o prémio Nobel e eu me fique pelas minhas duas únicas e exclusivas leitoras, uma nos Nozelos, outra em Alegrete, e que ainda por cima me confundem com um remoto «primo» no Brasil, provavelmente já defunto e, quem sabe (?!...), a usufruir de uma nova vida ou reencarnação como guia turístico em Bombaim ou jogador de futebol no campeonato do Cazaquistão...
Voltemos, pois, ao meu calo, que isto de digressões, literárias, artísticas ou turísticas é para quem sabe e pode. Fiquemo-nos pelo calo: é mais simples, universal e terra a terra.
Não me recordo se o meu calo era no pé direito ou no pé esquerdo. Ou se era nos dois pés. Se calhar era nos dois.
Seja como for, tinha estima pelo meu calo. Um bocadinho chato, às vezes, mas sempre presente até há algum tempo. Era alguém em quem se podia confiar, apesar das contrariedades: uma dorzita agora, um arranhãozito na perna, um pequeno incómodo no andar, mas sempre pronto e solícito, pois para isso tinha sido feito: chatear e incomodar o seu «dono», nem que fosse só um bocadinho. E ele pagava por isso, coitado. De tempos a tempos, como uma sentença, o meu calo era «decapitado» e deixava-me sossegado, pelo menos durante algum tempo. Mas ele voltava sempre, fiel que era, e eu aceitava-o resignado, como naqueles relacionamentos que já duram há alguns anos e aos quais nos vamos habituando, apesar das resmunguices, birras ou coisas similares.
O meu calo desapareceu para parte incerta, como aqueles amigos que desaparecem por algum tempo, embora sempre presentes. Não me parece que se tenha ido embora de vez, nem muito menos chateado, penso. Se calhar, foi gozar umas férias ou meditar para um retiro. Em todo o caso, meu caro calo, se alguma vez te chateaste comigo acredita que foi sem intenção da minha parte. Se isso aconteceu, peço desculpas. Ou, em linguagem mais cinematográfica ou novelísticas: volta, estás perdoado!
Como escrevi e previ, foi como costuma acontecer com o Saramago: sabia o titulo e a última frase. O recheio?!... Bem, o recheio... Talvez quem tenha um calo possa compreender...
Etiquetas: Escrita
<< Home