24 fevereiro 2018

Umas vezes perto, outras longe

Entrou na biblioteca e pediu para consultar o catálogo. Quem o atendeu apontou-lhe para um canto com forma de escondido, à esquerda de quem entrava, onde uma mesa equilibrava um computador já mais para o velho, com ecrã também da mesma época ou lá próxima, parecia-lhe, e o aviso na mesa confirmava. Não ficara impressionado pela recepção e pelo equipamento, que era de mil e nove e troca o passo, alguém lhe dizia, e ao contrário da mesa, de dois e mil e qualquer coisa, afiançavam-lhe as porcas e os parafusos, oriunda da cultura do it yourself e tenha paciência... Já que ali estava, ia ver no que davam as modas... Vinha à procura de um autor e de um livro obscuros (não eram todos?), agora que lhe tinham encomendado o serviço e que tinha que o apresentar até às 14h30, sem falta! Do autor só sabia que não sabia o nome, mas de quem toda a gente falava por ter escrito um livro sobre tudo e mais alguma coisa, assim como uma enciclopédia ou monólogo de quem acordou mal disposto ou anda de mal com a vida...Tentaria a abordagem directa. Não teve sorte à primeira, nem à segunda, nem à décima, acabando por desistir. Decidiu tentar no computador. Não sendo muito dado às crenças, mas não totalmente imune, há que reconhecer, à cautela cruzou os dedinhos da mão numa figuita, assim para o envergonhado, mas que se revelou de uma utilidade espantosa e logo à primeira tentativa! Como quem não quer a coisa, ali estava o autor e o livrinho de quem toda a gente falava mas de que ninguém conseguia recordar-se do nome ou do título! Para começo de reportagem não estava mal, não senhor. Resolveu pedi-lo e dar-lhe uma vista de olhos. Mas a coisa não ia ser fácil. Quando lho trouxeram, carregado de pó e de dedadas, desconfiou se alguém lhe tinha pegado há pelo menos um século, seguramente, e não se enganava. Apesar de tudo estava impecável, excepto talvez na página 1509, no canto inferior esquerdo, onde uma pequena marca de traça assinalava a antiguidade e o estado do calhamaço. Nas restantes 4896 páginas estava como novo! Olhou para o relógio e constatou o óbvio: não daria para almoçar. Para não defraudar os leitores - coisa impensável! - com um estalar de dedos daria conta do conteúdo do livro, mas teria que ser um estalar suave, pois a temática era venerável: Nem mais nem menos do que a procura e a conquista da felicidade, essa mesmo! Como se compreendia, era um livro mágico e, muitas vezes, algo confuso. Nada que um cálice de generoso não resolvesse.



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