09 outubro 2015

Críptico

Se tudo tivesse corrido bem, teria sido toureiro. Depreende-se que não correu, senão não estaríamos aqui mas sim ali, mais à frente ou mais atrás, para o lado ou talvez não. Ponto final na carreira de toureiro, que não chegou a ser concretizada, pese o ensaio dos passos e o tomar peso à espada, que para o capote já não houve tempo…
Umas coisas são um mistério e outras não o são, sendo apenas normais. É um mistério porque é que isto é assim, mas podemos sempre aventar hipóteses, umas mais misteriosas do que outras. Destas, umas serão completamente fantasiosas (e isso também é um mistério), que podemos (ou não) juntar ao outro. Para contrapor, as que serão mais realistas perdem em relação ao mistério, e isso não abona a favor delas. Talvez seja melhor, então, ficarmo-nos pelas fantasiosas…
Às vezes, tudo pode começar por um nome ou uma definição. Escolhamos o nome, ele também uma definição: críptico.
O sentido de humor pode revelar-se de variadas formas, umas mais evidentes, outras mais subtis. A cada feitio a sua forma, mesmo que não lhe assente bem. Se for este o caso, contudo, em que nem se dá conta do desconforto, então estamos numa dimensão inimaginável, mais misteriosa ainda. Não é esta que nos interessa. Se não é esta, outra há. Aproximemo-nos, pois.
Olhe-se em volta e busque-se qualquer coisa que nos alerte, se possível fazendo não muito barulho. Fazer ou não barulho não é coisa de somenos, como atestam os resultados das análises e se comprova com exemplos simples, retirados da experiência quotidiana. Para resumir: é fácil fazer barulho e difícil não o fazer. Ou fazer poucochinho.
Alguém abre uma porta e diz: «É só uma pequena chalaça». Como se espera, quem ouve pode ou não responder, rir ou não rir, chorar ou barafustar (nestes casos, carregando no melodrama), continuando a deitar achas para uma fogueira de que se não vêem labaredas, outro dos mistérios que se apresentam e que engrossam (pensa-se) a corrente de algo que tem um nome que não é vulgar, mas pleno de sentido.
Esperemos, pelo menos.
Abrem, de novo, uma porta (será a mesma?) e dizem: «Ela conhece-te». Ao olhar em volta, não está ninguém. Será mistério? Talvez. Mas surdo não estou. E cegueta também não! Se é mistério...
Todos os mistérios têm um dom: ser mistério. No caso presente, o mistério era mais uma confusão, habitualmente provocada pela propagação do som. Dizer «críptico» não é a mesma coisa que dizer «crítico», mesmo que muitos o pensem, sobretudo depois do Acordo, Ortográfico de apelido, (des)Acordo para muitos mais (aqui pagando o nome próprio pelos conselhos dos pais…), pois o «p» lá se lê e com pronúncia certa, por via das dúvidas e não contando como queda de consoante, muda, assim foi dito, mas que no nosso caso não é, até é bem pronunciadinha…
Se tivesse sido toureiro (coisa que já se sabe que não foi), este teria sido o momento de uma chicuelina, que o crítico avaliaria como se ele próprio a fizesse, a maioria das vezes não, mas para isso lhe pagavam e era a forma de ele (ou ela, nunca esquecer a paridade…) fazer a sua vida e dar a conhecer a sua arte.
Tratando-se do críptico, porém, a coisa continuará a ser um mistério. Daqueles que têm dom. Os únicos.

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