20 setembro 2014

Despertar

Tinha um despertador na cabeça, que funcionava bem e não atrasava. Dava-lhe corda duas vezes por ano, nos solstícios de Verão e do Inverno, e punha-lhe um bocadinho de óleo nos equinócios da Primavera e do Outono. As formas de acordar eram as habituais, por toque ou música, o que o levou a rescindir os contratos com o cuco do relógio de parede e com o galo do quintal, pagando-lhes uma indemnização e escrevendo cartas de recomendação, que ambos rejeitaram (só as cartas...). Mais difícil foram as conversações com o relógio da torre da igreja, que deixara de recorrer às badaladas do sino, em nome do progresso, e utilizava agora uma versão radiofónica (contrariando as normas do ruído), para apelar aos fiéis. Não se sabia onde arranjara o despertador, mas suspeitava-se que tinha sido numa visita ao Oriente, aonde fora, ainda novo, na comitiva do Marco Polo... Já tinha alguns anitos, é certo, mas continuava a funcionar bem...



Etiquetas: ,