Velhos
Passou-se hoje, à minha frente. O cenário é o de uma dependência bancária e os protagonistas são uma velhota - muito velha, mesmo - e uma funcionária do banco. Não sei o nome da idosa, mas apenas fixei a idade: 95 anos. A velhota estava a levantar dinheiro e contava à funcionária, uma moça jovem, os fins a que se destinava: alojamento, alimentação, familiares. Claro que não só a funcionária ouvia a história - repetida amiúde?... - como também todos os outros funcionários e clientes, incluindo eu. Era uma história comum nesta faixa etária, feita de tristezas, angústias e solidão - como é que será quando chegar a nossa vez?... - contada, contada e recontada. Do que tenho visto e ouvido noutros momentos, deve ser uma fase da vida em que talvez o mais importante seja encontrar alguém com disponibilidade para os ouvir: é isto que fazem nos consultórios médicos, nas compras, nas conversas com próximos ou estranhos ou em qualquer outro lugar a que acedam, como um banco.
Apesar das repetições e de uma compreensível surdez, gostei de ver o seu «desembaraço» nas equivalências que estabelecia entre o dinheiro «novo», o euro, e o «velho», o escudo, como se, com este exercício, quisesse como que iludir uma natural decadência física, mental e, sobretudo, vivencial, demonstrando, para quem quisesse ouvir, um apreciável domínio nesta matéria, que muitos, mesmo mais novos, não poderão invocar.
No caso dela, dada sua idade, as transições e adaptações a «dinheiros novos», entre outras novidades, devem ter sido mais que muitas. Quem contará a sua história?
Etiquetas: Face(stories), Sociedade
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