18 maio 2014

Palavrário de sucesso

Era criador de palavras, mas nem sempre o fora. Começara a sua vida pelo Além (de que se fartou depressa), passando-se de armas e alguma bagagem para o Aquém, numa fase da vida em que o aconselharam o investir no terreno dos afectos e «desafoitos» pela noite dentro, mantendo um negócio de porta semi-aberta, desbragada e com a lamparina acesa. Quando recorda esses dias, diz quem o ouviu, lembra-se de ter tido uma espécie de pressentimento do que viria a ser a sua vida futura, utilizando, pela primeiríssima vez, o célebre (hoje) neologismo «adaputacionar». Mas isso foram tempos de que se recorda, para trás lançados, e que já não voltam nem de boleia.
Eis, pois, o momento presente de criador de palavras, não de galinhas (como era o seu desejo e do crédito de que dispunha), curvado pela vénia do agradecimento a uma linha de crédito bonificada, destinada a empresários «autociosos», baptizada com o nome «balsântico» de 'Leve e Use'. O que ele fez.
Começou a criação com um substantivo e um verbo, hoje retirados. O franchising de alfabetos está «florescrevente» e já pensa «escrevestir» em viagens espaciais,  no segmento das mensagens por rádiotelescópio. Sobre o futuro nada diz, mas assume-se «confortante».

(em dívida para com Mia Couto)


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